Nacional

Intervenção de Mário Nogueira nos Restauradores

06 de novembro, 2010

Boa tarde! Enquanto funcionário público, dirijo-me aqui hoje, aos Trabalhadores de toda a Administração Pública, ou seja a quantos têm sido apelidados de malandros por aqueles que, no poder, têm sido exemplo do que de pior existe na governação de uma Nação e, também por isso, nunca hesitam quando se trata de atacar quem, honestamente, trabalha para que o país seja realmente melhor.

É neste contexto que me dirijo a vós, Amigos, Companheiros e Camaradas aqui presentes,

Quando, de manhã, nos noticiários radiofónicos, ouvi um governante afirmar, com aparente compreensão, que percebe perfeitamente os protestos e a insatisfação dos funcionários públicos e dos trabalhadores em geral, não pude deixar de pensar que já não bastava estarmos entregues aos bichos, ainda por cima são daqueles cuja boca verte veneno, no caso, sob a forma de mentiras e demagogia.

Que preocupações podem ter com a vida dos trabalhadores aqueles que aprovam e impõem medidas como as que hoje contestamos, fazendo-o a soldo de um capital ganancioso que não quer perder pitada dos seus lucros? De facto, não têm qualquer preocupação. Se tivessem, em vez de repetirem incessantemente, para disfarçarem a mentira, que estas medidas são inevitáveis, diriam a verdade. E a verdade é que elas resultam da sua opção política e não de qualquer inevitabilidade. Resultam do facto de sucessivos governos, agora do PS e noutras alturas do PSD, sozinho ou acompanhado, se terem rendido a um mercado sem rosto que esmaga os rostos dos que já não conseguem disfarçar um sofrimento e uma revolta cada vez maiores: os trabalhadores e as trabalhadoras do nosso país!

Estes são os governantes que, por opção e não por inevitabilidade, decidiram:

  • Cortar 3 mil Milhões na Educação, Saúde e Segurança Social, mas tiveram a lata de já ter enterrado mais de 5.000 Milhões no BPN;

  • São os que cortam mais de 90 Milhões na Justiça, mas aumentam quase em 37 Milhões o orçamento da Presidência do Conselho de Ministros;

  • São os que provocam a falência de milhares de pequenas e médias empresas, enquanto criam condições para que o BCP, nos primeiros 9 meses do ano tivesse aumentado os seus lucros em 22%;

  • São os que atiraram para a pobreza mais de dois milhões de portugueses e os que fizeram com que quase metade das crianças portuguesas apenas na escola ainda tenham condições para comerem uma refeição digna desse nome, mas, ao mesmo tempo, criaram condições para que, em 2009, tivessem surgido mais 600 multimilionários no nosso país;

  • São os que obrigam as empresas a pagar mais de 25% de impostos e os portugueses a terem de pagar 23% de IVA, enquanto a banca se fica pelos 4,3%, e, mesmo assim sob o protesto dos banqueiros;

  • São os que deixam os idosos sem condições para comprarem os medicamentos de que necessitam, mas enterram rios de dinheiro nas chamadas parcerias público-privadas, para gáudio e enriquecimento dos mesmos do costume.

Estamos perante inevitabilidades? Não, não estamos! Estamos perante opções que fazem com que, inevitáveis se tornem o nosso repúdio, o nosso protesto, a nossa resistência e a nossa luta!

Perante isto, que legitimidade têm os governantes para se dizerem preocupados pela situação que criaram aos portugueses e a Portugal? Legítimo é que duvidemos da sua sinceridade! Legítimo é que duvidemos de quantos, de face oculta, roubam o país e metem os portugueses em camisas de muitas varas, pretendendo lançá-los de altos penedos para fundos precipícios.

Sócrates, Coelho e Cavaco podem ter chegado a acordo para manter as políticas, agravando as medidas que, de há muito, vêm impondo aos trabalhadores e aos da Administração Pública em especial… mas nós não estamos de acordo com eles e por isso estamos aqui hoje, estaremos com todos os trabalhadores na Greve Geral do próximo dia 24 e estamos disponíveis para continuar a luta, assumindo cada combate com denodo e convicção, conscientes de que os problemas não se resolvem num quadro de alternância no centrão.

Afirmou ontem o líder do PSD, que deverão ser punidos, civil e criminalmente, os responsáveis pela situação a que chegou o país, nomeadamente em relação à dívida. Podemos até estar de acordo que a punição não se limite ao plano político, mas vindo do partido que vem, é caso para dizer que fala o roto do nu, sem sequer lhe perguntar “porque não te vestes tu?”

O que se passa na Educação é bem o retrato do que pretendem fazer a todos os serviços públicos e aos seus trabalhadores, sabendo-se que, sobre os cortes impostos a este sector, o acordo foi fácil naquelas discussões que nos fizeram lembrar os desentendimentos dos simpáticos Statler e Waldorf, figuras de uma animada série televisiva.

O que para a Educação se prevê no Orçamento de Estado para 2011 é que continuem a encerrar escolas, agora ainda com mais alunos; que se agrupem escolas por economia de recursos e não a pensar nos alunos e no seu sucesso; que as escolas se livrem de milhares de professores, de pessoal não docente, de psicólogos, de terapeutas, de assistentes sociais mesmo sabendo-se que isso fará aumentar a indisciplina e decrescer a qualidade educativa; prevê-se o corte de verbas de funcionamento que já hoje são exíguas, a degradação das condições em que a escola se organiza e funciona, ainda que deixe de cumprir integralmente e bem a sua missão de ensinar, qualificar, educar, formar e, afinal, contribuir para transformar.

Eles não se importam porque não querem essa escola. Preferem a que reproduz as injustiças, as desigualdades, os valores do individual em detrimento do colectivo e do social; preferem a que leva à resignação da maioria mesmo quando percebe que é explorada por uns quantos. Essa não é a Escola Democrática, não é a nossa escola. É a escola dos que também não querem que a sociedade seja democrática e pouco se importam com o facto de nela crescer o desemprego, a pobreza e a exclusão… é a escola dos que governam cavando e aprofundando fragilidades na sociedade que, por irresponsabilidade sua, podem começar a provocar rupturas muito complicadas de resolver.

Face a tudo isto, porque vemos, ouvimos e lemos… percebemos que o cerco está a ser movido, como dizia o Zeca, por um bando com pés de veludo que se aproxima pela noite calada… um bando constituído pelos que se acham mordomos do universo todo, senhores à força, mandadores sem lei. A esses, meus Amigos, temos de continuar a responder com esta força a crescer-nos nos dedos e uma raiva a nascer-nos nos dentes… E daqui dizemos ao poeta que o compreendemos e, por essa razão, não deixaremos que essa força nos deixe de mal connosco para que fiquemos de bem com outros que o não merecem. Iremos à luta, porque essa sim, é inevitável!

 Vivam os trabalhadores e as trabalhadoras portugueses!