Intervenções
Intervenção de Francisco Oliveira

Região Autónoma da Madeira: Para lá dos 9A 4M 2D

14 de junho, 2019

O dia 28 de dezembro de 2018 constitui um marco na luta sindical na Região Autónoma da Madeira, não tanto pela publicação do modelo de recuperação de todo o tempo de serviço dos períodos de congelamento, mas mais pelos desafios que isso nos abriu para o futuro. Na verdade, a publicação do Decreto Legislativo Regional 23/2018 foi encarado pela Secretaria Regional de Educação como um porto de chegada definitivo, como se depois dele não houvesse mais mares para navegar. Nessa visão, aí terminava o modelo de sindicalismo que tinha marcado as 4 décadas da existência do Sindicato dos Professores da Madeira. Era, pois, necessário inventar outra forma de atuação já que, na perspetiva da SRE, parecia ter deixado de fazer sentido a existência de um sindicalismo ativo, de reivindicação direta dos direitos dos docentes. Tinha acabado, pensavam eles, a tensão própria de quem se encontra em polos opostos na mesa de negociações. Pensavam eles que, em termos de relacionamento institucional, a nossa forma de atuação só poderia ser de reverência e de reconhecimento público de uma dádiva proporcionada pela benevolência dos nossos governantes. Muita sorte tinham os professores e os educadores por terem à frente dos destinos da RAM governantes tão seus amigos. Deixavam, pois, de fazer sentido quaisquer reivindicações profissionais ou, muito menos, iniciativas públicas de contestação.

Depois desta benesse dos deuses, competia ao SPM agradecer, reconhecer publicamente a sorte que era ser docente na RAM e reduzir-se ao papel de mera associação recreativa e cultural preocupada com o entretenimento dos seus associados.

Só que a realidade para quem anda no terreno e reflete vai muito para além da recuperação do tempo de serviço. Esse foi um problema que se arrastou por mais de uma década, ao longo da qual foram criados ou ficaram por resolver outras questões profundas. A resolução da injustiça causada pelo congelamento não pode, por isso, ser vista como um apagador que ao passar sobre o quadro profissional docente apaga tudo o mais. Não, hoje estão, ainda, por resolver inúmeras injustiças que continuam a pôr em causa o respeito pelos direitos dos docentes! Por isso, resolvido (pelo menos, de momento) aquele problema, partiu, de imediato, o SPM para outras lutas igualmente importantes. Resultado, saímos de um congelamento e entramos noutro: o das relações institucionais entre a Secretaria Regional de Educação e o SPM e, sobretudo, com a Direção Regional de Inovação e Gestão, responsável pela gestão do pessoal docente, que se tem recusado a reunir connosco desde o início do presente ano letivo.

No entanto, como poderíamos esquecer os diversos problemas que continuam a afetar os docentes para lá dos 9A 4M e 2D? Seríamos indignos da confiança que depositaram em nós os associados se não lutássemos,

  • desde logo, pela reparação das injustiças emanadas do próprio diploma da recuperação, nomeadamente pela reposição das bonificações pela aquisição de novas habilitações e pela atribuição das menções qualitativas mais elevadas;
  • pela regularização das carreiras, independentemente da data da vinculação dos docentes, pondo fim às ultrapassagens;
  • pela conclusão dos processos de avaliação pendentes e pelo reposicionamento de todos os docentes ao abrigo dos efeitos provocados pelo descongelamento ocorrido a 1 de janeiro de 2018 e pela recuperação dos 545 dias a 1 de janeiro de 2019;
  • pela aprovação de medidas de combate ao desgaste e ao envelhecimento que afetam um número crescente de docentes, não podendo nós aceitar que sejam obrigados a regressar às escolas docentes com doenças graves;
  • por um regime de vinculação ao fim de três contratos sucessivos e completos;
  • pelo respeito pelos direitos dos nossos colegas que se encontram a lecionar no ensino privado, que, com frequência, são vítimas de abusos e de exploração em termos salariais e de horários de trabalho;
  • pela eliminação das quotas de acesso aos 5.º e 7.º escalões;
  • pela eliminação dos percentis na atribuição das menções qualitativas de Muito Bom e de Excelente;
  • pela aplicação da portaria do reposicionamento ao nossos colegas do Conservatório – Escola das Artes da Madeira, que passaram para a carreira docente pública no dia 28 de agosto de 2017;
  • pelo respeito pela graduação profissional em todos os concursos;
  • pela obrigatoriedade de auscultação das populações e das comunidades educativas nos processos de fusões ou extinções e pelo respeito pelas suas posições;
  • contra a mentira tantas vezes propalada de que há docentes a mais nas escolas, quando sabemos que, por exemplo, neste ano letivo, houve vários alunos que ficaram sem professor em algumas áreas disciplinares ao longo de muitas semanas, por não haver quem os substituísse;
  • contra o desinvestimento na oferta pública de educação pré-escolar;
  • contra a falta de recursos materiais essenciais em algumas escolas, o que obriga a gastos pessoais dos docentes;
  • pela realização dos concursos de recrutamento e mobilidade fora do período de férias dos docentes;
  • pela aprovação de um calendário da educação pré-escolar idêntico ao do 1.º ciclo;
  • pela criação de um regime regional de pré-reforma para a Função Pública.

Além disto, há um conjunto de problemas que continuam por resolver, por exemplo:

  • na aplicação do DL 54 à Região Autónoma da Madeira;
  • na falta de recursos humanos para a concretização efetiva do DL 55, o que provoca uma grande sobrecarga de trabalho aos docentes afetos às escolas.

Não pretendemos, com isto, dizer que está tudo mal na educação da RAM; longe disso! Na verdade, temos de reconhecer que tem havido melhorias em vários aspetos e, noutros (municipalização e gestão das escolas, por exemplo), estamos um pouco melhor do que no continente. Ainda assim, temos de combater a tentativa de camuflagem de problemas que poderiam e deveriam ter um tratamento adequado, o que só não acontece por opção política.

A regulamentação da recuperação do tempo de serviço foi uma conquista importante dos docentes da RAM, e será, esperamos nós, dos docentes de todo o território nacional. Todavia temos a responsabilidade de continuar a luta incessante pela dignificação da Carreira Docente.

 

Vivam os professores!

Viva a FENPROF e todos os seus sindicatos!