Revisão dos Estatutos de Carreira
Sala cheia no ISEL (11/11/2009). A alteração do cenário político não chega, é preciso lutar e pressionar!

Politécnico: plenário nacional exige substituição do regime de transição do Estatuto de Carreira

11 de novembro, 2009

Reunidos em encontro nacional, promovido em Lisboa pela FENPROF e pelo SNESup, na tarde de 11 de Novembro (esta quarta-feira), centenas de docentes do Ensino Politécnico, que encheram o vasto auditório do ISEL, exigiram a substituição do regime de transição do ECPDESP (Estatuto de Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico). A iniciativa contou também com a participação de representantes das bancadas parlamentares do PCP, Bloco de Esquerda, CDS/PP e PSD.  Participaram também, entre outros dirigentes sindicais, João Cunha Serra, coordenador do Departamento de Ensino Superior e Investigação da FENPROF e Gonçalo Xufre, Presidente do SNESup, além de docentes de vários pontos do País, com destaque para o Norte.

Com esta reivindicação, patente em numerosas intervenções tanto da mesa como da assistência, pretende-se fazer justiça aos docentes que se encontram fora das categorias da nova carreira, a desempenhar funções permanentes, em regime de tempo integral ou em dedicação exclusiva.

70 por cento dos docentes
em situação precária


Os quase 30 anos de aplicação prática do anterior Estatuto de Carreira conduziram à situação actual de existência nas instituições de corpos docentes maioritariamente precários, com um enorme número de docentes (cerca de 70%) fora das categorias de professor de carreira, a exercerem funções permanentes, em regime de tempo integral ou em dedicação exclusiva, muitos dos quais há mais de 15 ou de 20 anos.

Mário Carvalho, da FENPROF, apresentou uma caracterização do corpo docente do Ensino Superior Politécnico a nível nacional, recorrendo a estatísticas oficiais. Num universo de cerca de 10 000 docentes, apenas 2800 estão na carreira. A abertura de concursos tem sido muito reduzida ao longo dos anos. 4/5 dos docentes não têm doutoramento. 

O docente do Politécnico do Porto sublinhou a propósito que o novo estatuto exige a mais de 3370 docentes (com contratos precários) que tenham doutoramento no prazo de 6 anos. Ou seja: metade dos docentes avançaria para a formação e depois para os concursos, e a outra metade integraria as funções de júri. É caso para perguntar: como é que nesse período funcionariam as escolas e os cursos? Quem daria as aulas? Quem daria apoio aos alunos? Quem dinamizaria os projectos?
"A transição é injusta", realçou Mário Carvalho.

Que soluções?

Como resolver a situação? Que soluções propõem os docentes e as organizações sindicais? Como foi sublinhado em várias intervenções neste encontro nacional, no novo quadro político saído das recentes eleições legislativas, importa substituir com urgência o regime de transição previsto no diploma de revisão da carreira, que é injusto e inadequado, e ameaça a estabilidade das instituições e a qualidade do seu desempenho, por um que tenha em consideração a história do subsistema, das suas instituições, das suas escolas e da aplicação do anterior Estatuto.

E mais: importa instituir um regime que, aos que há já muitos anos se dedicam por inteiro às suas instituições, estando fora da nova carreira, frequentemente tendo já o mestrado (antiga qualificação de referência) ou o doutoramento, não apresente como única alternativa para a obtenção de um vínculo estável a obrigação de colocarem os seus postos de trabalho a leilão, através de concursos onde, além de serem obrigados a competir com os seus pares na mesma situação, irão estar em pé de igualdade com quem nunca deu uma única aula, ou trabalhou em algum projecto, numa escola do Politécnico.

Das perspectivas saídas deste encontro destacou-se a consagração, à semelhança do que sucedeu no subsistema universitário, aquando da introdução do doutoramento como qualificação de referência, um regime de transição que permita a integração nas categorias da nova carreira a todos quantos já disponham daquele grau académico ou que, num suficiente período transitório, o venham a obter, sem prejuízo da avaliação necessária para a consolidação do respectivo contrato por tempo indeterminado, no final do período experimental, e uma vez garantidos os apoios necessário, como é o caso da dispensa de serviço docente.

Outra perspectiva: contemplar um regime transitório com efeitos semelhantes para quem obtenha o título de especialista e para quem, não se achando já em condições de adquirir qualquer das novas qualificações de referência, dê provas de ter adquirido, ao longo da sua extensa vida académica, qualificação equivalente, frequentemente validada por avaliações já realizadas.

As intervenções dos deputados

Expressivas, pelo que disseram (PCP, BE e CDS/PP) e pelo que não disseram (PSD), foram também as palavras dos deputados presentes nesta iniciativa sindical.

Miguel Tiago, do PCP, lembrou a precipitação que envolveu o diploma de revisão de carreira, sem tempo para um verdadeiro debate, lançado pelo PS "à beira do final da legislatura". O parlamentar comunista fez alguma ironia quando interrogou se o Ministro Mariano Gago teria ideia dos impactos desse diploma..."Certamente teria uma ideia das consequências dessa atitude de secundarização do Ensino Superior Politécnico, desse ataque ao corpo docente e dessa asfixia financeira do ensino superior em geral". O deputado manifestou "empenho" da sua bancada na solução dos problemas do Politécnico e concretamente do Estatuto de Carreira ("estamos disponíveis") , observando ainda que há que "conhecer as reais posições dos outros partidos".

"Esta é uma sala cheia de gente com razão", salientou Cecília Honório, do Bloco de Esquerda, que realçou a importância da luta dos docentes e investigadores e das suas organizações representativas "por uma visão diferente do Ensino Superior, pela identidade própria do Politécnico".
Destacou a "injustiça" que a anterior maioria fez abater sobre "professores, que deram o seu melhor" e condenou o regime de precariedade laboral que Mariano Gago manteve no Politécnico. "Depois de anos de trabalho, mudam as regras do jogo e dizem às pessoas: aguentem-se!  Isto não pode ser", concluiu.

Michael Seufert, do CDS/PP, também condenou a solução feita à pressa pela anterior maioria e chamou a atenção para a iniciativa parlamentar do seu partido para pedir a reapreciação do diploma de revisão da carreira dos docentes do Politécnico. Mostrou-se confiante na revisão desse documento. "É preciso travar os pormenores mais gravosos", afirmou.

Por seu turno, José Ferreira Gomes, da bancada laranja, começou por lembrar que as comissões especializadas da Assembleia da República (no momento desta iniciativa) ainda não começaram a trabalhar e lá foi avisando que estava ali a intervir a título pessoal. O ex-vice-reitor da Universidade do Porto lançou fortes críticas ao mandato de Mariano Gago, alertou para o sistema de avaliação dos docentes do Superior ("também vai trazer alguns desgostos"), falou das políticas de estrangulamento financeiro das instituições, mostrou a sua indignação pelo esquecimento e pelas críticas a que o Ensino Politécnico tem sido votado em Portugal ao longo da sua história, mas sobre as reais posições da bancada do PSD em matéria de efectiva convergência para a substituição do regime de transição - embora reconhecendo que é necessário combater injustiças - pouco ou nada deixou transpirar, tendo manifestado concordância com as intervenções das outras forças políticas presentes e dos sindicatos.

Como foi sublinhado no encontro do ISEL, a alteração do cenário político não chega. É preciso lutar e pressionar! / JPO