Intervenções 2.º e 3.º CEB e Ensino Secundário
14.º Congresso

António Anes (SN): 2.º e 3.º ciclos do Ensino Básico e Secundário

16 de maio, 2022

Decorridos 6 anos de um consulado ministerial protagonizado por Tiago Brandão Rodrigues, que se pautou por uma postura antinegocial sem memória, expetativa-se que algo melhore com esta nova equipa do ME protagonizada agora por João Costa, esperando que, como ministro, altere a postura do anterior Ministério da Educação.

E muito terá que se alterar.

Em relação ao 2º e 3º ciclos do ensino Básico e Ensino Secundário, e deixando de fora as exigências intersectoriais tratadas numa perspetiva mais geral, permitam-me destacar:

Os horários e condições de trabalho

  • A persistência de muitas escolas, com a conveniente conivência tácita do Ministério da Educação, em construírem horários dos docentes com abusos e ilegalidades, constitui um gritante desrespeito pela dignidade da profissionalidade docente, incompreensível quando perpetrada por outros docentes, diretores de escolas, que conhecem, ou deveriam conhecer, as condições difíceis que o trabalho da docência nas escolas exige.
  • Abusos e ilegalidades que já vêm sendo cometidos, pelo menos desde 2018, por alguns diretores que, treslendo e interpretando de uma forma abusiva o despacho 10- B sobre a organização do ano letivo, têm construído horários que constituem uma sobrecarga do trabalho dos docentes.
  • Constituem exemplos claros desta realidade: 
    • As horas para reuniões regulares não estarem incluídas na mancha horária dos docentes;
    • O apoio a mais do que a um aluno e as coadjuvações não serem considerados componente letiva.
    • O recurso a sinónimos criativos ou expressões redundantes para designar atividades claramente letivas, de modo a serem incluídas na componente não letiva do docente.
    • Os excessivos “furos” nos horários, que obrigam os professores a permanecerem dias inteiros nas escolas, muitas das quais sem espaços e o equipamento necessário para a realização de atividades inerentes à componente individual de trabalho do docente.
    • O elevado número de níveis, turmas e funções nas escolas.
    • O abuso e desregulação dos horários dos docentes que lecionam o ensino profissional muitas vezes obrigados a repor horas de formação para além do seu horário semanal e não pagas como horas extraordinárias 

A este propósito convém recordar que, em 2018, em reunião pedida pela FENPROF ao Ministério da Educação, o Secretário de Estado Adjunto e da Educação, agora ministro, concordou em clarificar, por escrito, as escolas, sobre essas situações. Mas, para além de uma NOTA À COMUNICAÇÃO SOCIAL sobre o Despacho de Organização do Ano Letivo, em 4 de julho 2018 (onde algumas dessas questões foram esclarecidas, mas não assumidas) nunca fez a prometida informação para que os diretores, em todas as escolas, construíssem manchas horárias consistentes, sem abusos nem ilegalidades.

Os horários dos professores transformaram-se assim em cargas excessivas de trabalho (letivo e não letivo) ultrapassando em muito as 35 horas legais. Tal foi confirmado por um inquérito feito pela FENPROF aos docentes do 2º e 3º CEB e Ensino Secundário, cuja perceção se traduziu em mais de 46 horas reais de trabalho.

Destaque-se que muitos professores destes setores de ensino ainda são sobrecarregados, arbitrariamente, com o trabalho de classificação de provas de avaliação externa (quase) nunca compensados por esse exercício de óbvia exigência.

Será que continuará a ser necessário, para pôr cobro a esta situação e terminar com esta sobrecarga de trabalho, a FENPROF prosseguir com uma greve às horas que, ilegalmente, têm sido incluídas nos horários dos docentes?

Já este ano letivo, e a propósito de colmatar a falta de professores que, esclareça-se, já vem de alguns anos atrás, as direções de muitas escolas, novamente com o apoio do ME, acrescentaram mais alterações abusivas às manchas horárias, impondo horas extraordinárias que vieram desajustar e pôr em causa a justa organização familiar que os docentes têm que fazer em cada início de ano letivo.

Pode-se admitir o recurso a horas extraordinárias em situações mais extremas, para que os alunos não sejam prejudicados, mas nunca impostas à bruta e ilegalmente e que venham a desregular as manchas horárias iniciais dos professores.

Neste início de uma nova legislatura e de um novo Governo, importa que os professores continuem a manifestar discordância com esta situação de desregulação dos seus horários e consequentemente das suas vidas. Os abusos e ilegalidades terão que ser combatidos.

A FENPROF tem apresentado soluções. Entre outras:

  • Atribuir às escolas maiores créditos horários para o justíssimo e obrigatório apoio aos alunos com dificuldades;
  • Colocar atempadamente os professores, para prevenir estas e outras situações de apoio;
  • Possibilitar às escolas poderem transformar os horários a concurso em horários completos;
  • Colocar os estagiários, futuros professores, nas escolas com horário atribuído e, claro, remunerado;
  • Abrir a possibilidade a que quem tenha optado por outra opção de vida queira agora enveredar pela docência;
  • Atribuir horas extraordinárias, não sendo desejável, poderá, excecionalmente, ser também uma opção, mas devidamente negociada e com consentimento dos docentes.
  • Alargar o leque de professores corretores de exames e dar melhores condições para quem for contemplado com mais esta sobrecarga de trabalho.

(A este propósito recorde-se que a FENPROF irá pedir uma reunião ao senhor ministro numa perspetiva de negociar um conjunto de medidas que atenuem esta sobrecarga dos professores corretores)

O que não pode nem deve é continuar-se a abusar da vida dos docentes, desregulando, ao nível do absurdo e ano após ano, os seus horários de trabalho.

E se o destaque nesta minha intervenção foi dado aos horários e condições de trabalho, não a poderia terminar sem sublinhar, exemplificando com três ou quatro temas de política educativa em que a FENPROF deve exigir ser parceiro ativo na discussão, na avaliação e na negociação:

  • As Aprendizagens essenciais (AE) que, por despacho 6605-A/2021 de 6 de julho de 2021, passaram a constituir os únicos referenciais curriculares terminando com os programas disciplinares;
  • Os exames, o regime de acesso ao ensino superior, as provas de aferição, que impelem alguns professores a prepararem os alunos para a avaliação externa, afunilando e subvertendo a própria avaliação;
  • Os planos de recuperação de aprendizagens Escola + 21/23. Recuperação essa que se deve fazer no quadro da autonomia de cada escola, que é quem melhor sabe o que é preciso fazer, no respeito pelo trabalho dos professores. Dêem-se as necessárias condições.
  • Os Planos de Inovação Curricular e Pedagógica que, entre outros aspetos possibilitam uma gestão pelas escolas de mais de 25% do currículo e a criação de novas disciplinas. Também neste domínio não se poderão cometer excessos que ponham em causa a coerência de um currículo mínimo nacional que todas as escolas deverão concretizar.

 

Novos tempos, novo governo. Está na hora de negociar, está na hora de lutar

VIVA A FENPROF!