Acção reivindicativa
Conselho Nacional da FENPROF, Outubro, 2003

Plano de Acção: Ensino Superior e Investigação

27 de novembro, 2003

Introdução
A apresentação em separado da parte do Plano de Acção específico para o sector do ensino superior justifica-se pelas dificuldades em integrar num texto abrangente as questões que interessam a todos os sectores, do pré-escolar ao ensino superior. Estas dificuldades têm que ver com o facto de este sector ser tutelado por um Ministério diferente dos restantes o MCES , por ser abrangido por estatutos de carreira e regimes salariais, diferentes dos associados ao chamado ECD que abrange todos os outros sectores da educação e ensino públicos e por ser completamente diferente a organização territorial, a autonomia, a gestão, a relação dos professores com as instituições escolares, designadamente ao nível da contratação e da vinculação ao Estado.
Muitas questões são evidentemente abrangentes, nomeadamente os efeitos da política geral do Governo para com os trabalhadores em geral e para com os da administração pública, em particular, e as consequências da política para a educação e o ensino.
Deste modo, tudo o que se refere nos capítulos I e II, bem como grande parte do conteúdo do IV se aplicam ao ensino superior. O que é específico do ensino superior e que a seguir se enuncia, representa essencialmente aquilo que para o ensino superior deve ser o teor do capítulo III, incluindo as acções a desenvolver.

Organização
A FENPROF, nomeadamente através do seu Departamento do Ensino Superior e no âmbito da preparação do próximo Congresso, irá realizar um balanço da organização do sector do ensino superior e da investigação e elaborar propostas, com vista a uma melhor ligação deste sector aos sócios do ensino superior, inscritos nos vários Sindicatos da FENPROF; a tornar mais participados e eficazes os processos de tomada de decisão sindical da FENPROF sobre o ensino superior; a aumentar o impacto deste sector da FENPROF na comunidade académica nacional e a tornar mais eficaz o trabalho conjunto entre o sector do ensino superior e os restantes sectores de ensino, designadamente em matérias de interface, como é o caso da formação de professores, da reforma do ensino secundário e do acesso ao ensino superior.

Financiamento
O Governo, no âmbito da sua cega obsessão pela redução do défice público, comprometendo as condições necessárias ao desenvolvimento do país, designadamente, decretando a redução do poder de compra dos trabalhadores de administração pública, pôs o carro à frente dos bois e fez aprovar pela maioria que o apoia na Assembleia da República uma lei do financiamento do ensino superior cujos objectivos foram os de aumentar as propinas entre 30 e 130%, e aumentar o apoio financeiro, de forma praticamente incondicional, às instituições de ensino superior privado. Simultaneamente o Governo atribuiu às instituições a liberdade para fixarem o valor das propinas dentro de um intervalo que corresponde ao valor das propinas pagas no ano lectivo passado, procurando dividir o ónus político do aumento das propinas com as instituições e transportando para o interior destas factores de grande conflitualidade.
Entretanto, os orçamentos de funcionamento atribuídos para 2004 às instituições, fixados de forma pouco transparente ao invés do ocorrido nos anos anteriores as instituições não foram desta vez sequer ouvidas representam um corte relativamente aos do corrente ano (já muito reduzidos) que em média corresponde à subtracção do diferencial entre o valor previsto para a cobrança das propinas, se fixadas no limite mínimo, e o valor cobrado no ano passado. Mais uma vez o aumento das propinas teve como consequência uma correspondente desresponsabilização do Estado pelo financiamento do ensino superior público, contrariando o estabelecido na lei que considera as propinas como verbas destinadas ao aumento da qualidade. A exiguidade dos orçamentos tem levado muitas instituições a aprovar ou a tentar fazer aprovar a propina máxima.
Esta actuação do MCES, que vem na sequência dos cortes orçamentais do ano passado e dos cortes cegos nas vagas de acesso, para este ano lectivo, ao ensino superior público, inscreve-se no objectivo do Programa de Estabilidade e Convergência, aprovado pelo Governo, de não atribuir nem mais um cêntimo ao ensino superior público, até 2006 (mas apoiar mais ainda o privado quanto ao financiamento e ao acesso).
A FENPROF procurará criar nas academias, de forma conjugada com as organizações representativas de estudantes e de não-docentes, um movimento de oposição à desresponsabilização do Estado pelo financiamento do ensino superior público, exigindo que o financiamento tenha em conta as necessidades de um ensino e uma investigação de qualidade e sejam acordados entre a tutela e os representantes das instituições, com base em critérios objectivos, conhecidos por todos.

Autonomia e Gestão
Foram aprovados na generalidade pela Assembleia da República uma proposta de lei do Governo sobre Autonomia e um projecto de lei do PS sobre a mesma questão. A proposta do Governo representa a tentativa de liquidação da gestão democrática, ou participada, e de instauração de modelos de gestão autoritários, através da atribuição de quase todos os poderes a órgãos unipessoais, designadamente, a directores nas escolas.
A FENPROF, apesar de reconhecer que há aperfeiçoamentos a introduzir no actual modelo de gestão, designadamente melhorar a capacidade de gestão estratégica e a eficácia na prossecução de objectivos, entende que é fundamental preservar os valores da participação, da colegialidade das decisões, das liberdades académicas (no ensino e na investigação) e da liberdade de opinião.
Assim, a FENPROF procurará mobilizar todos os docentes, em particular aqueles que pertencem aos órgãos de gestão, para que neles sejam tomadas posições públicas em defesa da gestão participada e contra a gestão autocrática que o MCES e o Governo pretendem impor.

Estatutos das Carreiras Docentes
O MCES vem adiando, desde a tomada de posse do actual Governo, as negociações sobre os estatutos das carreiras docentes do ensino superior. Alegando atrasos nos processos legislativos que projectara (lei de financiamento, lei de autonomia e lei de bases da educação), o MCES prometeu em Maio último o início das negociações para o início do actual ano lectivo.
A FENPROF reclama a imediata abertura de negociações com os seguintes objectivos principais:
a) Desbloqueamento das promoções
Encontrando-se os quadros, em muitas instituições, completamente preenchidos e existindo um grande número de candidatos em condições curriculares para acederem à categoria superior, a FENPROF tem reclamado a resolução deste problema através da criação de quadros globais adequadamente dimensionados, que permitam que as promoções se possam realizar independentemente da existência de vagas nesses quadros, desde que o docente obtenha aprovação numa prova de mérito absoluto prevista para o efeito.
b) Estabilidade de emprego na administração pública.
A FENPROF tem reiteradamente denunciado a situação inaceitável e inconstitucional de precariedade de emprego em que se encontram cerca de 70% dos docentes do ensino superior e vem reclamando a sua integração nos quadros e a possibilidade da sua passagem para outra carreira da Administração Pública, sempre que não venham a reunir as condições necessárias para o prosseguimento nas careiras docentes do ensino superior e desde que tenham concluído com aprovação um período probatório a definir.
Para a FENPROF estas são duas medidas justas e necessárias aquelas que garantirão o direito de todos os docentes a uma efectiva carreira, sejam eles do universitário ou do politécnico, e a que permite tirar o melhor partido dos recursos humanos existentes, tão necessários ao desenvolvimento do país.

Subsídio de desemprego
Os consecutivos cortes orçamentais que têm sido impostos às instituições por sucessivos governos têm representado uma cada vez mais intensa pressão no sentido de que aquelas reduzam os seus efectivos de pessoal docente, designadamente pela via do despedimento dos docentes que se encontram em situações de maior vulnerabilidade (convidados das universidades, e equiparados e assistentes dos politécnicos). Este movimento tem levado a que os efectivos de pessoal docente, medidos em equivalentes em tempo integral (ETI), se afastem cada vez mais por defeito dos ETI padrão fixados pelo MCES, o que ameaça comprometer a qualidade do ensino.
Para além dos despedimentos directamente provocados pelas restrições orçamentais, verificam-se outros, resultantes da não atribuição da nomeação definitiva a professores e de não obtenção do doutoramento nos prazos definidos no ECDU. Para todos estes casos os colegas despedidos saem sem o direito ao subsídio de desemprego.
O subsídio de desemprego é um direito de subsistência que a todos assiste e que não pode ser recusado a qualquer cidadão e, por essa razão, a FENPROF tem-se batido fortemente pela sua aprovação.
A FENPROF conseguiu em 2000 que a Assembleia da República aprovasse legislação que atribuiu aquele direito aos educadores e professores dos ensinos básico e secundário, mas viu nessa altura inviabilizada pelo Ministério da Educação, pelo Governo e pela Assembleia da República (o PCP apresentou um projecto de lei que foi recusado) a sua reclamação de que também os docentes e investigadores do ensino superior fossem abrangidos.
Entretanto, o Tribunal Constitucional, a solicitação do Provedor de Justiça, que para tal tinha sido instado pela FENPROF, veio em 2002 a declarar o não cumprimento da Constituição, por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequível o direito ao subsídio de desemprego relativamente a trabalhadores da função pública.
A actual Assembleia da República voltou a recusar em 2 de Outubro de 2003 um projecto de lei do PCP com objectivo idêntico ao que fora chumbado em 2000.
A FENPROF vai continuar a bater-se pela aprovação do subsídio de desemprego para os docentes e investigadores do ensino superior denunciando a atitude dos partidos da maioria que assim procuram fugir ao cumprimento da decisão do Tribunal Constitucional.

Ensino Superior Particular e Cooperativo
No que se refere ao Ensino Superior Particular e Cooperativo (ESPC) mantém-se a situação de impasse nas negociações de um Contrato Colectivo de Trabalho para os docentes, quanto a contratação e carreira, pois a APESP apenas aceitou negociar clausulas gerais relativas a pessoal docente e não-docente. O Governo, pelo seu lado, continua sem mostrar qualquer interesse em regulamentar os regimes de contratação e de carreira, como é obrigado a fazer pelo disposto nos Estatutos do ESPC.
Conseguir um instrumento regulador da contratação e da carreira dos docentes do ESPC, negociado com os sindicatos, é um objectivo prioritário da FENPROF para este sector.
Entretanto o Governo decidiu em tempo de exames que imediatamente antecede o período de férias apresentar na assembleia da República uma proposta de lei sobre autonomia que abrange instituições públicas e privadas.
Nesta proposta de lei é dada às entidades instituidoras a capacidade para contratar docentes sem a concordância dos conselhos científicos dos estabelecimentos de ensino, visto que a única coisa a que são obrigadas é a ouvir o conselho científico. Consideramos esta solução desprestigiante para o ESPC, pois abre portas ao amiguismo e ao nepotismo e pode fechá-las à qualidade.
A proposta que a FENPROF avança é a de que as contratações de novos docentes resultem de um apelo público à apresentação de candidaturas e de uma avaliação curricular a ser realizada a esses candidatos por uma comissão incluindo representantes das entidades instituidoras e dos conselhos científicos, devendo a seriação dos candidatos ser devidamente fundamentada.
Para a FENPROF é essencial que se verifique uma viragem na situação profissional dos docentes do ESPC de modo a que finalmente possam ter os seus regimes de contratação e de carreira regulados de modo satisfatório para a sua dignidade profissional e de maneira a que seja posto termo às arbitrariedades das entidades instituidoras quanto a despedimentos sumários, reduções unilaterais de cargas lectivas com os correspondentes cortes salariais, etc.
A situação no ESPC chega à FENPROF sobretudo pelos casos que aparecem no contencioso dos vários Sindicatos pertencentes à Federação e pelos escassos dados obtidos do MCES. A FENPROF irá trabalhar no sentido da recolha dos dados necessários à caracterização da situação sócio-profissional dos docentes do ESPC, condição indispensável para que possamos estar melhor apetrechados a tomar posições em defesa dos interesses dos nossos sócios neste sector. Neste Observatório do ESPC a FENPROF procurará caracterizar os corpos docentes dos estabelecimentos do ESPC, em termos das suas situações profissionais: docentes, sem outra ocupação profissional, leccionando apenas numa instituição; docentes, sem outra profissão, leccionando em mais do que uma instituição; docentes do ensino público que acumulam com o ensino privado; docentes com outra ocupação profissional principal e que leccionam em acumulação com essa actividade; etc.
A FENPROF irá procurar as melhores formas de ultrapassar as tradicionais dificuldades de envolvimento dos associados deste sector no trabalho sindical, pois sem isso os sindicatos são instrumentos da vontade e da acção dos seus sindicalizados será muito difícil melhorar a eficácia da nossa actividade no ESPC, indo para além da muito importante acção de defesa dos direitos individuais pela via dos nossos serviços de contencioso.
 
Investigação
A FENPROF irá batalhar pela aproximação do país às médias europeias no que se refere a número de investigadores na população activa e no que concerne ao investimento em % do PIB. Irá ainda dedicar grande atenção aos problemas dos bolseiros de investigação que se encontram associados à falta de emprego científico e aos atrasos nas transferências para as unidades de investigação das verbas de programas financiados com fundos comunitários, bem como dos financiamentos programáticos. Também a carreira de investigação científica será objecto da atenção da FENPROF, em particular no que se refere aos direitos dos investigadores, à progressão na carreira e à estabilidade de emprego.