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Cancelamento da Festa da Música

Contas de Mega Ferreira e ministra não coincidem

12 de dezembro, 2006

A ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, e o presidente do Centro Cultural de Belém, António Mega Ferreira, entraram  num fogo cruzado de declarações sobre as contas do centro a propósito do cancelamento da Festa da Música. No fim do dia, os números e a forma de olhar para eles continuavam a não coincidir: o CCB diz que vai ter menos, a ministra diz que vai ter mais.

O presidente do CCB, há um ano no cargo, anunciou na segunda-feira que, por causa do corte de 600 mil euros do Ministério da Cultura em 2007, tinha que acabar com a Festa da Música tal como a conhecemos há sete anos: muitos concertos e os melhores intérpretes do mundo concentrados numa maratona de três dias de música.

Mega Ferreira anunciou, como substituto, os Dias da Música em Belém, com metade dos concertos (de 115 em 2006 para 51) e um terço do custo (de 1,2 milhões de euros para 400 mil).

Ontem de manhã, no Fórum da rádio TSF, a ministra elogiou a opção de Mega Ferreira, mas questionou a justificação financeira: "Fala-se em terminar a Festa da Música por razões de carácter puramente orçamental, mas isso não é rigoroso: o orçamento do CCB tem menos 600 mil euros, mas deixará de ter a seu cargo o Centro de Exposição, que significava [em 2005] um défice orçamental de 900 mil euros. Donde, é claro para qualquer pessoa, que o orçamento [aprovado] resulta num orçamento superior ao do ano passado."

Assim, segundo a ministra, o CCB terá, para o ano, mais 300 mil euros. "Como em 2007 o Centro de Exposições não será programado, não vai haver esse prejuízo de 900 mil euros", simplificou o seu assessor Nelson Lopes. Com a criação do novo Museu Berardo - que abre em 2007 ocupando todo o Centro de Exposições do CCB -, o centro de Belém vai deixar de programar exposições.

Mega Ferreira, porém, não percebe as contas da ministra. "A ministra fez umas contas complicadíssimas. Não sei onde vai descobrir 900 mil euros", disse ontem ao PÚBLICO.

O presidente usa os números de 2006: teve 1,3 milhões de euros para despesas de produção de exposições e conseguiu 800 mil de receitas. Feitas as contas, chega a 500 mil euros de défice. Como o corte em 2007 é de 600 mil, Mega Ferreira diz que o desaparecimento do Centro de Exposições "pouparia" ao CCB apenas 100 mil euros. Mas, acrescenta, como o Museu Berardo ainda não abriu e o CCB tem exposições até ao final de Fevereiro de 2007, e como "há essas despesas de 250 mil euros, mesmo no estrito raciocínio da ministra, o fim do centro seria uma poupança de 350 mil euros". Sendo o corte de 600 mil, segundo Mega, o CCB fica a perder 250 mil.

"Não havia outra solução"

A Festa da Música foi suspensa porque "não havia outra solução", insistiu ontem Mega Ferreira. "Mantenho, manterei e demonstrarei." O presidente diz que fez o possível para a festa acontecer: "Sempre disse que em 2007 íamos fazer a festa, mas também sempre disse que o seu peso era excessivo e que a partir de 2008 iríamos rever o conceito com René Martin", o francês que criou e é o director artístico da Festa da Música.

Martin manteve-se ontem incontactável. Chegou a ser anunciado um comunicado de imprensa seu, que acabou por não sair. Está previsto para hoje.

Fazer uma festa mais pequena não era possível, diz Mega. "Com 400 mil euros, tem que se fazer opções não de forma mas substanciais." Porque o contrário "seria vender gato por lebre".

A possibilidade de ser um grande mecenas a pagar a Festa da Música "é completamente ilusória, porque o mecenato não existe em Portugal", diz. Em 2007, o CCB tem 400 mil euros de mecenato, que são na realidade, diz, mais patrocínios a eventos, porque têm contrapartidas.

Mega Ferreira defende que o fim da Festa da Música "não é nenhuma tragédia". Sublinha, porém: "Se me derem o dinheiro, com certeza que faço a festa. Se houver alguém que apareça, encantado. Era o que eu queria."

Câmara de Lisboa quer saber mais

O CCB está a contar com o apoio da Câmara Municipal de Lisboa, que para a última festa deu 100 mil euros, num protocolo assinado para três anos.

Mega diz que o presidente da câmara, Carmona Rodrigues, concordou, em Outubro, com o novo projecto Dias da Música em Belém. Mas o vereador da Cultura, José Amaral Lopes, que falou ontem em nome da câmara, disse que o presidente foi informado sobre a necessidade de alterar o evento, mas que é preciso conhecer em detalhe o novo projecto. "O apoio está condicionado a conhecermos o projecto. Temos que analisar. Não se pode extrapolar e dizer que aplaudimos o fim da Festa da Música", disse Amaral Lopes, acrescentando que a Festa da Música é o exemplo do projecto que nos últimos anos conseguiu atrair novos públicos.


22.11.2006 - 16h37  
 Isabel Salema, : Bárbara Reis