Nacional
Lisboa, 12 de Setembro de 2008

A POLÍTICA DO "PRÉMIO" NA EDUCAÇÃO: Encontro com a Comunicação Social. Uma iniciativa da FENPROF

12 de setembro, 2008

"Prémio Melhor Aluno"

Encontro com a Comunicação Social. Uma iniciativa da FENPROF

Lisboa, 12 de Setembro - Hotel Marquês de Sá

Um prémio que desvaloriza os esforço da maioria dos alunos,
numa lógica puramente meritocrática

UMA MEDIDA QUE AFASTA A ESCOLA DO SEU PRINCIPAL PAPEL

Mário Nogueira, a abrir o encontro com os órgãos de comunicação social referiu que "todo este foguetório faz com que passem despercebidas questões essenciais".

Centrando a sua intervenção nesta ideia, o Secretário-Geral da FENPROF criticou o facto de Lurdes Rodrigues admitir ser desnecessário o alargamento da escolaridade obrigatória (prometido em 2005 e constando do Programa do Governo) até ao 12.º ano, abandonando uma das bandeiras deste Governo, deixada, agora, cair. "Este é o reconhecimento do fracasso das suas políticas - afirmou -, pois esse indispensável alargamento previsto até 2010, exige a resolução prévia de problemas estruturais que têm, como consequência, as elevadíssimas taxas de insucesso e abandono escolar que persistem".

Quanto ao "dia do diploma", Mário Nogueira identificou-o como "o caminho mais barato, mas mais mediático, para, com mil euros por escola (2 prémios de 500 euros), o Governo fazer uma festa que oculta o subfinanciamento da escola ou a inexistência de apoios claros e suficientes para obras, equipamentos e para a requalificação de todo o parque escolar."

Segundo o ME "o objectivo seria", acrescentou, "distinguir o mérito dos que mais se esforçaram e dedicaram à actividade escolar." Mas não ficarão de fora aqueles que mais se esforçaram para, na escola, obterem resultados positivos, embora não sendo os mais elevados?

Mário Nogueira, na intervenção inicial desta inciativa, não deixou passar em claro esta cultura meritocrática que, sob a capa de um alegado reconhecimento, o que faz é, de facto, desvalorizar o papel da escola e o esforço efectivo de milhares de alunos e professores!

A situação crítica da Escola, as medidas de política educativa com incidência profissional nos docentes, são um sinal de fracasso sentido pela generalidade dos professores, mas também, cada vez mais, pelas populações, observou Mário Nogueira. Além dos dois docentes e investigadores referidos, estiveram na Mesa deste encontro com os jornalistas outros dirigentes da FENPROF: Anabela Delgado (SPGL), Abel Macedo (SPN), Anabela Sotaia (SPRC) e Joaquim Páscoa (SPZS).

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Sérgio Niza
Director do Centro de Formação do Movimento da Escola Moderna
e Docente do Instituto Superior de Psicologia Aplicada


Ritual de distribuição de diplomas é do século XIX

"Revela uma orientação de política do Governo, contrária ao ideário socialista, de onde emerge o Governo."

"O ritual de distribuição de diplomas é do século XIX, das escolas republicanas do século XIX. Um momento solene empertigado com a presença das autoridades sociais, significando o término de um ciclo com êxito. Um ritual apropriado pela cultura anglo-saxónica, pelos Estados Unidos da América, sendo que Portugal foi apropriar-se desse antigo ritual e pretende aplicá-lo a jovens do século XXI."

"Tratam-se de rituais antiquados o que prova a falta de originalidade das políticas em curso."

"A distribuição de dinheiro aos alunos que se distinguiram, é coisa que os republicanos não ousariam. Nunca comprariam os alunos com prémios. Isso é contemporâneo e pertence a uma visão mercantilista e empresarial da escola, em que os prémios correspondem aos prémios de produção, atribuídos aos trabalhadores."

"Não se compagina com os valores culturais e de desenvolvimento humano e social e de política de cidadania da escola. Estes gestos, que podem vir a ser acolhidos por alguns, farão rebentar estas contradições e esta forma pouco coerente de conceber a educação dos portugueses. É que os prémios prendem-se com outras artimanhas de gestão do sistema, como os sociólogos do governo sabem bem. Premeiam os alunos do secundário que não precisam de dinheiro. Aguarde-se e confirmar-se-á como o feitiço se virará contra o feiticeiro."

"Aliás, esta contradição aplica-se a outras áreas na Educação, como com a profissão docente, em que o controlo extensivo do trabalho dos professores acentuará a proletarização da função docente, numa altura em que devíamos construir a profissionalidade docente. Estas medidas de hipercontrolo dos professores geram uma depreciação do Estatuto e dos efeitos que deveria proporcionar (autonomia, autoridade e reconhecimento)."

"Este tipo de avaliação de desempenho tem uma lógica de vigilância. Para ser barato entregou-se aos professores todo o processo burocrático, o que vai provocar tensões internas desagregando a profissão."

"A sobrevivência deste grupo profissional, levará, no entanto, à destruição do que este Governo está, erradamente, a querer construir. No plano histórico-cultural esta política não vai resultar." / S.N.

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Rui Trindade
Docente da Faculdade de Psicologia
e Ciências de Educação da Universidade do Porto


Uma medida contraditória com o que se pretende da Escola

"É uma medida desnecessária, leviana, socialmente injusta."

"Este prémio não vai reconhecer o esforço de alguns dos que mais se esforçaram. Há alunos que passam de menos de 10 para 11 ou 12 valores e só o conseguem com um tremendo esforço. É reconhecido? Não é, e isso é injusto! Despreza o mérito que existe no esforço enorme de muitos, reconhecendo apenas o de alguns".

"Isto reflecte que o sucesso que se obtém não é reconhecido como tal e enquanto sucesso. É necessário pagar! Não chega ter sucesso. Tem de ser pago. Promove uma visão narcisística, típico das revistas cor-de-rosa. A valorização do mérito de uns contrói-se com o insucesso dos outros. Às vezes por uma décima. Esta décima é das coisas mais arbitrárias..."

"Uma medida contraditória com o que se pretende da escola."

"É uma concepção de mérito que tem como única missão promover a selecção académica dos jovens. Milhares de jovens nunca verão o seu esforço reconhecido, mas este às vezes foi conquistado com muita dificuldade."

"Esta visão de mérito pode funcionar para os jogos olímpicos mas não para a Escola. E reconhece o sucesso escolar como um acto de afirmação individual. E nós não podemos conceber assim a educação e a escola portuguesa, pois queremos que os nossos jovens tenham a percepção da importância social da escola, do sucesso escolar e das aprendizagens."

"O que os estudos têm vindo a mostrar é que é a organização cooperativa do trabalho na sala de aula que é importante e produz bons resultados e não a promoção deste individualismo."

"Como se compagina a evolução científica e pedagógica com esta visão que este governo tem da escola?"

"Trabalhar de uma forma cooperativa não é tratar todos por igual, mas sim todos de forma diferenciada. E a escola só tem sentido se o sucesso também for valorizado de forma diferenciada."

"O que precisamos, de facto, não é premiar os mais capazes, mas sim que as nossas escolas pudessem preparar-se para que cada aluno seja o mais capaz possível." / R.T.

    
Rui Trindade, Sérgio Niza...                                                             ...e Mário Nogueira "desmontaram" a política do Prémio

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Tomada de posição do SPN

No dia em que o Governo, através do Ministério da Educação, assinala, com pompa e circunstância, a entrega de diplomas de conclusão do Ensino Secundário e a atribuição de um prémio pecuniário aos alunos com melhores classificações, o Sindicato dos Professores do Norte considera o Dia do Diploma uma medida instrumentalmente desnecessária e pedagogicamente conservadora e elitista.

Instrumentalmente desnecessária, porque nem os alunos que podem obter o referido prémio necessitam dele para se sentirem reconhecidos pelo seu desempenho escolar, nem os outros alunos, que não demonstraram ter condições e disponibilidade para atingir patamares de sucesso tão elevados, passam a dispor destas condições ou a manifestar outra disponibilidade só porque vêem os seus colegas receber um tal prémio.

Pedagogicamente conservadora e elitista, porque propõe uma concepção demasiado restrita de mérito, mais como instrumento de legitimação de um processo de selecção académica do que de reconhecimento das qualidades e potencialidades do trabalho realizado por todos e por cada um dos alunos. Uma concepção que, por isso, conduz a uma situação aparentemente paradoxal, já que a exaltação do mérito de uns obriga, necessariamente, à desvalorização do mérito de outros.

Importa ainda reflectir se um projecto de educação escolar próprio de uma sociedade democrática pode conceber o acto educativo como interessado, apenas, em promover a afirmação individual dos sujeitos ? o que, afinal, justifica a crença de que a competição entre os alunos é que garante a qualidade do trabalho que eles realizam.

O Sindicato dos Professores do Norte reafirma que, numa sociedade democrática, a Escola Pública não pode ser um espaço de reprodução das desigualdades que, não tendo a sua génese no interior da mesma, poderão ver-se agravadas por decisões que afectam o que acontece nesse espaço. O reconhecimento do mérito, tal como este Governo o propõe, é uma dessas decisões, porque aquilo de que hoje necessitamos é que, em vez de premiar os mais capazes, tudo seja feito para estimular cada um dos alunos a ser cada vez mais capaz. Daí que o dinheiro que hoje se disponibiliza para premiar o mérito de alguns pudesse ser investido para o bem de todos, noutras medidas mais úteis e, sobretudo, mais adequadas aos propósitos e valores que norteiam o sistema educativo português.

A Direcção do SPN
12/09/2008