Os 80 anos de Fernando dos Santos, mais conhecido pelo "Quim Boy" do Barreiro, podem impedir que os dentes se mobilizem todos no mesmo grito de luta, mas "nesta idade" e "na situação degradada em que está Portugal", o que importa é "defender os interesses do povo, dos trabalhadores, dos reformados e dos doentes". Sim, porque "os remédios estão pela hora da morte", censura o antigo caldeireiro, enquanto tenta, a custo, enfiar o cartaz encarnado num velho pau: "A minha frase é original. Desemprego e fome em Portugal, Sócrates só ajuda o capital".
O primeiro-ministro, no entanto, não lhe pode responder. A sua imagem jaz num monte de bandeirolas e panfletos, usurpadas com furor pelos milhares de manifestantes que chegam à Praça do Toural, em Guimarães, a poucos minutos do pavilhão multiusos, onde se reúne a nata da União Europeia.
"Neste momento, estão aqui mais de seis mil pessoas, entre delegações e trabalhadores, mas há-de ultrapassar as dez mil", prevê Adão Mendes, da União de Sindicatos de Braga, contabilizando já o grupo que chega de Santarém, de Macedo de Cavaleiros, de Lousada, de Sesimbra. Afinal, chegaram aos 20 mil.
"Galizaaa!!", ouve-se repentinamente um grupo de homens, bandeiras cubanas ao alto, figura de Che Guevara na lapela "As políticas de baixos salários e as más condições laborais não afectam só Portugal, mas a Galiza e toda a Europa", diz Ramon Gonzalez, da Confederação Intersindical galega. "Estamos cada vez pior", quebra-lhe o raciocínio Maria dos Anjos, que se juntou à manif apenas porque "o Sócrates só nos traz é miséria". E "repressão", atalha José Araújo, auxiliar de acção médica no hospital de Guimarães. "E rouba-nos as regalias sociais que Abril nos deu", acrescenta o vendedor António Vieira.
"Apesar de Portugal estar com a presidência da UE, o país que trabalha continua a querer fazer ouvir a sua voz", descreve o eurodeputado bloquista Miguel Portas. / Jornal de Notícias, 6/07/2007