Nacional

Intervenção de abertura por Mário Nogueira, Secretário Geral da FENPROF

07 de dezembro, 2016

A realização deste Encontro, neste momento, é muito importante porque é tempo:

- De balanço, não por estarmos no final do ano, mas por ter passado o primeiro ano dos quatro para que está mandatada a atual equipa do Ministério da Educação e o Governo em funções;

- De definição de prioridades para a ação reivindicativa dos professores em 2017;

- De uma primeira tomada de posição pública sobre o péssimo projeto de revisão do regime de concursos apresentado pelo ME;

- De irmos ao Ministério da Educação levar as posições que aqui aprovarmos sobre os aspetos antes referidos e de nos fazermos ouvir na rua, espaço que, em momento algum, a FENPROF trocará pelos corredores do poder.

O ano que passou, afirmamos com satisfação e até orgulho, foi marcado por resultados muito positivos que resultaram de uma luta que a FENPROF nunca abandonou, mesmo quando a mobilização se tornou menos fácil e quando outros se entendiam com o governo, por exemplo, para manter viva a PACC, o exame Cambridge ou se calaram perante os cortes salariais ou o congelamento das carreiras, entre outras malfeitorias.

No ano que passou, acabou a PACC, acabaram as BCE, acabou o PET/Cambridge, acabaram os exames aos meninos do 4.º e do 6.º ano, acabaram os vocacionais aos 12 anos, foram cortadas verbas a colégios privados que, criticando o papel do Estado na Educação, se têm alimentado de verbas estatais, foi aprovada a gratuitidade dos manuais escolares em todo o 1.º Ciclo, foi aprovada medida que garante que nenhum aluno, por razões alheias à sua vontade, deixará de acompanhar os colegas em visitas de estudo, acabou a requalificação em que já tinha caído mais de uma centena de docentes da Educação e da Segurança Social, acabaram os cortes salariais, foi reduzida e acabará este ano a sobretaxa de IRS, foram repostos os feriados… e poderia acrescentar mais algumas medidas que são positivas e pelas quais lutámos, no âmbito da FENPROF, da Administração Pública ou em conjunto com todos os trabalhadores portugueses.

Não desvalorizamos o que conseguimos

É nossa opinião que o alcançado é suficiente? Não. Mas, por um lado, não desvalorizamos o que conseguimos e, por outro lado, por percebermos que vale a pena lutar, ganhamos mais força para continuar a luta. E os objetivos por que teremos de continuar a lutar são de enorme importância, porque muito importante é e será sempre dar valor aos professores e defender a Escola Pública de qualidade.

Em relação a estes dois aspetos, percebendo que o Orçamento do Estado para 2017, aprovado há dias, nada tem a ver com o orçamento que a anterior maioria aprovaria (seria um orçamento orientado para a privatização, a municipalização, a desvalorização da Escola Pública, a elitização do acesso ao conhecimento e uma ainda maior redução do número de profissionais das escolas), é, contudo, um orçamento que não dá resposta à urgente necessidade de valorização dos professores e de investimento na Escola Pública. Não dá resposta o Orçamento, terá de as dar, entre outros, o Governo e estamos cá para a exigir.

Quanto à Escola Pública, reconhecendo que deixou de estar em perigo por opção ideológica, acontece que defendê-la não pode limitar-se a intenções, por melhores que sejam, pois até o Inferno está cheio de bem-intencionados. São precisas medidas como:

- A redução do número de alunos por turma, que tarda, apesar de ser compromisso;

- A desagregação dessa aberração pedagógica que são os mega-agrupamentos;

- A aprovação de currículos que, de uma vez por todas, acabem com disciplinas e vias, num caso nobres, em outros pobres;

- Uma verdadeira descentralização que acabe de vez com o processo de municipalização lançado pelo governo anterior;

- A colocação de recursos nas escolas que garantam uma verdadeira inclusão, pois sem recursos a inclusão é uma mentira e não passa de uma manta sob a qual se escondem manchas de segregação e de exclusão.

- E, medida das medidas, a mais urgente de todas, devolver às escolas a gestão democrática que, em 2008, foi completamente revogada.

Os professores são o alimento principal
de uma escola de qualidade

A Escola Pública, porém, nunca se afirmará adequadamente se não contar com profissionais valorizados, dignificados e respeitados. Podemos dizer, sem mentir, que, até recorrendo à escravatura, se fizeram extraordinárias obras de arte. É verdade, sendo disso exemplo as pirâmides do Egito construídas por escravos, como dissemos ao ministro no passado dia 25. Mas, daí para cá, deram-se tremendos progressos civilizacionais, acabou a escravatura e aos trabalhadores foram reconhecidos direitos que a democracia reconheceu e, no caso Português, a Constituição consagra.

Os professores são o alimento principal de uma escola de qualidade e os professores portugueses são dos melhores que existe no mundo, o que também não será alheio ao facto de serem dos mais bem qualificados que existem.

Se dúvidas houvesse sobre o que afirmo, o relatório que acompanha o PISA, cujos resultados foram ontem divulgados, esclarece ao referir que os professores tiveram um papel fundamental nos bons resultados alcançados pelos alunos portugueses. Os professores portugueses são mesmo os primeiros de todos na capacidade que têm de adaptar o seu trabalho às necessidades dos seus alunos, aos seus ritmos de aprendizagem, às suas dificuldades específicas. Não nos surpreende esta conclusão.

Não nos surpreende porque os professores portugueses não regateiam esse esforço; não deixam de honrar o seu compromisso ético para com os alunos; cumprem zelosamente os seus deveres profissionais como, ainda ontem em Braga, mais uma vez, tive ocasião de verificar junto de colegas extremamente orgulhosos do trabalho que desenvolvem com os seus alunos, ali, nas escolas, no terreno, em linguagem sindical, que é onde a atividade sindical deve ter a sua principal sede.

Prioridades para a nossa ação

E é por serem assim, competentes e grandes profissionais, que os professores portugueses têm toda a legitimidade para exigirem: respeito pelos seus direitos; políticas e medidas que valorizem e melhorem as suas condições de trabalho; políticas e medidas que contrariem o enorme desgaste e o reconhecido envelhecimento da profissão. São estas as razões por que a FENPROF propõe que elejamos como prioridades para a nossa ação:

- A luta por um regime especial de aposentação para os docentes;

-A luta por um regime de vinculação que combata efetivamente a precariedade no setor, ou seja, que ao fim do terceiro ano de serviço os professores ingressem nos quadros e na carreira, no escalão correspondente ao seu tempo de serviço;

- A luta por horários de trabalho em que o que é letivo e não letivo seja devidamente definido e em que as reduções de componente letiva, que se destinam a  atenuar o desgaste dos profissionais, voltem a ser consideradas na componente individual de trabalho;

- A luta em defesa das carreiras, seja pela resolução das ilegalidades que persistem, pelo descongelamento das progressões ou pela contagem integral do tempo de serviço que nos foi roubado.

- A luta pela gestão democrática das escolas que, em janeiro próximo, conhecerá um novo impulso com a campanha nacional que iremos promover.

Uma luta, muitas vezes de rua, e por isso terá momentos como o que hoje se propõe, em que entregaremos no ME um abaixo-assinado em que mais de 20.000 professores exigem o que acabo de referir.

Primeiros sinais de arrogância...

Da parte do Ministério, começam a surgir os primeiros tiques de arrogância, com o ME a informar a FENPROF que ninguém estará disponível, hoje, para receber esse abaixo-assinado e os documentos que aqui aprovaremos. Ora, essa resposta é motivo acrescido para que nem um dos que aqui estão deixe de se deslocar à porta do ME, no final do Encontro, também para dizer ao Senhor Ministro que não vá por esse caminho… outros, antes dele, fizeram essa opção e, como todos sabemos, deram-se mal.

Como obter os resultados, dificílimos, exigentes, que nos propomos? Não há outra hipótese que não seja apresentar propostas e lutando por elas. E se há luta que parece aproximar-se é a luta por um regime de concursos justo e que combata a instabilidade e a precariedade que se abatem sobre os professores. O projeto apresentado pelo ME é uma enorme deceção, pois desrespeita 4 princípios fundamentais nesta matéria: combate à precariedade; promoção da estabilidade de emprego e profissional; justiça entre candidatos; equidade no tratamento de situações semelhantes.

A este propósito, colegas, a FENPROF, ao contrário de outros que nada dizem sobre o que defendem, assumiu com clareza as suas posições e todas as que defender no ME serão públicas, logo do conhecimento dos professores. Por sermos assim claros, porque assim devemos ser, são alguns os mails que recebemos de colegas defendendo esta ou aquela posição específica que gostariam de ver assumida pela FENPROF. Reconhecemos legitimidade a cada colega para, nesta matéria, defender a solução que lhe é mais favorável. Isso é legítimo e respeitado, mas há uma coisa de que a FENPROF não abdicará, é que neste processo negocial, como, aliás, em todos os outros, o que nos fará mover serão sempre princípios e nunca interesses, porque é essa a forma de estar da FENPROF.

Para assumirmos a luta que será necessária – caso se revele mesmo necessária, vamos ver, pois o processo negocial, propriamente dito, ainda não se iniciou; apenas nos foi entregue um projeto que o próprio ME considerou um ponto de partida – temos de levar por diante um grande trabalho, nacional, de esclarecimento de debate com os colegas, a desenvolver nas escolas. Esse trabalho não é responsabilidade apenas de alguns dirigentes sindicais, mas de todos os dirigentes, delegados e ativistas, de quantos continuam a acreditar na força dos professores, na sua capacidade de luta e na eficácia dessa luta.

Hoje, nós, daremos esse exemplo quando nos deslocarmos ao ME em representação dos mais de 20.000 colegas que nos confiaram a assinatura; no início de janeiro, em torno do dia 6 (última reunião prevista do processo regular de negociação) promoveremos plenários de professores em todo o país para fazer um ponto de situação das negociações, mas, igualmente, definirmos um calendário de luta, caso o ME teime em não abrir mão das propostas mais penalizadoras dos professores.

Desafios para 2017

Em 2017, porém, a nossa ação e luta terão de ir mais longe, pois das prioridades que definimos para a ação reivindicativa, só uma, a vinculação, passa pela revisão do regime de concursos. Aposentação, carreiras, horários de trabalho e gestão democrática são de outros campeonatos que serão por nós disputados com espírito ganhador. Temos de garantir, e isso depende muito de nós, que 2017 seja o ano de dar mesmo valor aos Professores e à Escola Pública, mas para que isso aconteça não bastam lindas palavras e rasgados sorrisos, são necessárias políticas que concretizem mudanças profundas em relação ao passado.

Às vezes, Colegas, sou levado a pensar sobre o que terá achado o Ministro da Educação que seria, no atual contexto político, a postura da FENPROF. Que se calaria para quatro anos pelas medidas tomadas no primeiro? Que, face às convergências conseguidas, em alguns aspetos, entre PS, BE, PCP e PEV iria passar a simples espetadores? Se pensou isso é porque não nos conhecia, decerto.

FENPROF: compromissos
só com os professores

Nem a FENPROF quebra o silêncio porque quem nos quis silenciar nos acusa de silenciosos; nem a FENPROF deixa de lutar porque entre alguns partidos foi possível chegar a posições conjuntas, importantes, sem dúvida, mas que não comprometem esta que é a maior organização sindical de professores em Portugal.

No respeito pelas opções políticas e partidárias de cada um, que são as mais diversas, a FENPROF não tem nenhum pacto ou acordo com qualquer partido ou governo e compromissos só os tem com os professores.

Nunca seremos, para este ou qualquer outro governo ou Ministério, o que, no passado, outros têm sido, ainda que hoje se queiram mostrar os campeões da exigência. Seria bom que tivessem resistido à PACC, à municipalização, ao mal explicado Cambridge ou à eliminação da gestão democrática das escolas… mas não o fizeram. Preferiram poupar dinheiro para o papel couché que hoje usam na sua propaganda.

Com a FENPROF, os professores sabem com quem contam e com o que contam; sabem que saudaremos o que for positivo e lutaremos contra o que entendermos ser negativo. Não sabemos estar de outra forma e não nos poupamos a esforços quando em causa estão as causas dos professores e da Escola Pública.

Valorização, dignificação e respeito pelos direitos
dos Professores e Educadores 

Os professores portugueses nunca viraram a cara à luta quando perceberam que era chegado o momento. Pois bem, o momento aproxima-se, pois são sempre oportunos os momentos em que a palavra de ordem passa por defender uma Escola Pública de qualidade, democrática, para todos, inclusiva e gratuita, pois ela é fator incontornável de igualdade de oportunidade, e por defender a valorização, dignificação e respeito pelos direitos dos Professores e Educadores que ajudam a construir essa Escola, sendo eles, nesse contexto, os principais artesãos do futuro das sociedades democráticas. / Mário Nogueira