Educação Especial
É fundamental legislação que garanta o direito à educação, em igualdade de oportunidades, a todas as crianças e jovens com necessidades educativas especiais

Crianças e jovens com NEE: petição promovida pela FENPROF foi debatida no Parlamento

12 de julho, 2008
Ao fim da manhã de 11 de Julho (sexta-feira), a reunião plenária da
Assembleia da República analisou e debateu a petição nº 444/X/3ª,
apresentada pela FENPROF, solicitando "a revogação do Decreto-Lei nº
3/2008, de 7 de Janeiro, e a sua substituição por legislação que
garanta o direito à educação, em igualdade de oportunidades, a todas
as crianças e jovens com necessidades educativas especiais (NEE)".
Todos os Grupos Parlamentares se pronunciaram sobre a matéria. A
bancada do PS foi a única que assumiu a defesa daquele decreto.

O deputado "centrista" José Paulo Carvalho saudou os autores da
petição e lembrou, logo de seguida, que aquele decreto-lei "era
nefasto" e "resultado claro da arrogância desta equipa do Ministério
da Educação".
"Por via da apreciação parlamentar", acrescentou o representante do
CDS/PP, "conseguiu-se expurgar do texto algumas opções erradas, alguns
aspectos maléficos". "Apesar das alterações introduzidas, mantemos as
nossas discordâncias", sublinhou.
José Paulo Carvalho alertou para a descrição restritiva de
necessidades educativas especiais e para a criação de "autênticos
guetos pedagógicos", afirmou que este decreto "acaba com a intervenção
precoce" e declarou que "não é adequado" utilizar a CIF - OMS, 2001
(Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde)
como instrumento para a elegibilidade de alunos com necessidades
educativas especiais com direito ao apoio especializado da educação
especial.
Embora tenha salientado que "este é um mau diploma", que a AR em parte
já alterou, o deputado do CDS/PP afirmou que "não é razoável revogá-lo
neste momento", embora concordando com muitas das críticas que são
apresentadas. "Faz sentido que a AR melhore este documento", concluiu.

Rosalina Martins, do PS, foi a única deputada que fez a defesa do
decreto-lei nº 3/2008, de 7 de Janeiro, começando por afirmar que o
normativo "não surgiu do nada", lembrando "medidas anteriores" tomadas
pelo Executivo no âmbito deste sector de ensino, como, por exemplo, "a
criação de quadros de educação especial", que "anulou o destacamento
anual de professores", proporcionando uma "melhoria na gestão de
recursos humanos"; a criação de escolas e agrupamentos de referência
para alunos com deficiência; o aumento da produção de manuais em
Braille, entre outras medidas.
A deputada do PS declarou que este decreto-lei "pretende uma
clarificação" (embora não especificando) e deu origem a um amplo
debate, recolhendo contributos oriundos da sociedade civil, e que
"pretende uma clarificação, eliminando um subsistema de onde as
crianças não saíam"...

Depois de afirmar que Governo e ME, "numa matéria tão delicada,
mantiveram a arrogância e insensibilidade social", a representante do
PSD neste debate lembrou que a AR introduziu alterações ao documento,
apontando, por exemplo, a "liberdade de escolha dos pais quanto ao
estabelecimento a frequentar pelos filhos". Afirmou que estas
melhorias "não devem ser partidarizadas" e sublinhou a oportuna
reacção do Parlamento à proposta original da maioria PS. "A AR já
mexeu no decreto", realçou a parlamentar do PSD, que anunciou uma
proposta de "avaliação real" do normativo, por iniciativa da sua
bancada parlamentar. Tal avaliação deverá, garantiu, abarcar "o que
está a acontecer e o conjunto das alterações introduzidas pelo
Parlamento".
"Se a inclusão estiver em causa, o PSD apresentará um projecto de
lei", revelou.

A deputada independente Luísa Mesquita afirmou que este decreto está
em vigor há meia dúzia de meses e já mostrou vários aspectos
negativos. Através de exemplos vividos nos distritos do Porto e de
Santarém, pôs em evidência as contradições entre as promessas da
ministra da Educação ("nenhuma criança será deslocalizada") e a
realidade. "Há crianças que são afastadas da família e das comunidades
respectivas de segunda a sexta-feira" e "outras são obrigadas a
percorrer largas dezenas de quilómetros" diariamente.

Ana Drago, do Bloco de Esquerda, acusou a bancada do PS de "não ouvir
nem os pais, nem os professores, nem os especialistas". Para esta
representante do BE, "há um nítido retrocesso" nesta matéria, como
consideram também "várias deputadas do PS". A palavra de ordem do
decreto é a exclusão de alunos com necessidades educativas especiais,
alertou Ana Drago, que alertou para situações de marginalização e de
segregação.
Este decreto tem um efeito trágico no do sistema de ensino, nas
escolas e na vida dos jovens e crianças com NEE, realçou a
parlamentar, que afirmaria a dado passo:
"Os professores estão a organizar-se, quase clandestinamente, para que
os alunos não fiquem sem apoio. Isto é uma vergonha. Este retrocesso
terá consequências imprevisíveis".

O deputado João Oliveira, do PCP, realçou a importância e a
oportunidade desta petição com 14 mil assinaturas e afirmou, logo no
início, que este projecto "envergonha o País e devia envergonhar o
PS". Para a bancada comunista, o normativo desrespeita a Declaração de
Salamanca e os princípios fundamentais de um conjunto de documentos
internacionais.
"Trata-se de um projecto que pretende validar a política deste Governo
nesta matéria", afirmou João Oliveira. "Quando aposta na redução dos
apoios, quando revela quase exclusivamente preocupações economicistas,
quando aposta na utilização da CIF, quando aponta para guetos e aposta
na redução brutal do número de professores de Educação Especial, este
decreto valida uma política errada, injusta e preocupante", destacou o
parlamentar do PCP.Depois de lembrar que o decreto PS "ignora estudos
e informações de várias entidades" que no dia a dia trabalham, com crianças
e jovens com necessidades educativas especiais, o deputado comunista afirmou
que "as equipas de monotorização do ME impõem ainda mais restrições na
identificação de alunos com NEE".
Com este decreto, abrem-se as portas ao negócio privado. "Os serviços
que a escola pública deveria prestar, passa a ser assumido pelos
privados...", concluiu.

O Partido Ecologista "Os Verdes" saudou esta petição e os seus
proponentes. "Em boa hora e com boa razão avançaram para esta
iniciativa", sublinhou Madeira Lopes, que considerou as que as
alterações introduzidas pelo Parlamento no decreto PS "não produziram
melhorias significativas". "A apreciação parlamentar serviu apenas
para mostrar a coincidência de opiniões, em vários aspectos, das
bancadas do PS e do PSD", declarou. O deputado ecologista disse que
este era "uma lei cruel, uma vergonha e um dos marcos mais negros da
legislação deste Governo e desta maioria" e que representa "uma
machadada profunda no apoio fundamental que deve ser dado aos alunos
com NEE".

Carta da FENPROF
ao Director Geral da UNESCO

Recorde-se, entretanto, que a FENPROF dirigiu em meados de Junho
passado uma denúncia ao Director-Geral da UNESCO, Koïchiro Matsuura,
pelo facto de o Governo Português colocar em causa princípios
fundamentais da Escola Inclusiva ao utilizar a CIF - OMS, 2001
(Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde)
como instrumento para a elegibilidade de alunos com necessidades
educativas especiais que terão direito ao apoio especializado da
educação especial.
No texto enviado pode ler-se que, sendo Portugal um país que aprovou,
em 1991, legislação de grande importância, que permitiu dar passos
positivos no sentido da construção de uma escola verdadeiramente
inclusiva, não surpreendeu que o Estado Português tenha subscrito, em
1994, a Declaração de Salamanca, entre outros compromissos e
convenções internacionais sobre esta importante problemática.
Só que, acrescenta o texto, o actual Governo, sem atender às
preocupações de entidades com reflexão e intervenção nesta área, veio
revogar o Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de Agosto, substituindo-o pelo
Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro, alterado pela Lei n.º
21/2008, de 12 de Maio, criando uma situação que contraria os
princípios do compromisso que assumiu ao impor uma definição
restritiva de necessidades educativas especiais e uma organização e
funcionamento das Escolas / Agrupamentos que obrigará as crianças a
serem deslocadas das suas comunidades para as designadas escolas de
referência (por tipologia de deficiência) que o Ministério da Educação
definirá em despacho;
O Governo impôs ainda, sublinha a mensagem da FENPROF, uma avaliação
Pedagógica dos alunos com necessidades educativas especiais por
referência a uma classificação clínica - CIF - OMS, 2001.
Por fim, a FENPROF informou o Director-Geral da UNESCO de que o
Ministério da Educação e o Governo Português afirmam estar em curso um
forte investimento na aplicação das novas medidas legislativas, embora
não explicite que o investimento será estabelecido com cortes
orçamentais aplicados no próprio sistema, que o deterioram, ao criar
escolas de referência por tipologia de deficiência e concentrando aí
os alunos deficientes.
A FENPROF lamentou que, os responsáveis do Ministério da Educação
Português, apenas profiram palavras de grande intolerância face às
posições públicas assumidas pela Federação Nacional dos Professores. A
título de exemplo, a FENPROF deu conhecimento de, no dia em que
promoveu uma conferência de imprensa com o objectivo de denunciar as
consequências gravosas das medidas legislativas, o Senhor Secretário
de Estado da Educação apenas se limitar a acusá-la de mentir
"compulsivamente" e de a denúncia à UNESCO pretender, apenas, denegrir
internacionalmente a imagem do Estado Português.
A FENPROF enviou, ainda, as suas preocupações para todos os órgãos de
soberania e entidades que, na Conferência de Imprensa realizada em 6
de Junho, anunciou e cujo texto pode ser recuperado em www.fenprof.pt.