Todas as notícias
Ensino Particular e Cooperativo

Negociações com chantagem? Não, obrigado!

24 de junho, 2015

Encontro nacional "Ser docente no ensino particular e cooperativo"

"Temos que alargar a participação dos docentes nas lutas e nos protestos, nas reivindicações em defesa da sua dignidade profissional", sublinhou Mário Nogueira nos momentos finais  do encontro nacional "Ser docente no ensino particular e cooperativo", iniciativa da FENPROF que decorreu no passado sábado, 4 de julho, em Lisboa. O dirigente sindical alertou para as situações de desvalorização profissional e precariedade dos docentes deste subsistema. "Da nossa parte, da parte da FENPROF podem contar que há uma coisa que nunca faremos: não nos poremos de cócoras..."

O debate revelou especiais preocupações com o ambiente de pressão sobre os docentes que se vive em numerosos colégios e também com a necessidade de  defesa dos direitos, das carreiras, dos salários e dos horários de trabalho, destacando-se a exigência de uma nova convenção para o setor, mas sem abdicar, enquanto tal não acontecer, da aplicação plena do atual Contrato Coletivo de Trabalho (CCT) subscrito pela FENPROF e que continua a vigorar. 

Os participantes neste encontro sindical, oriundos de várias regiões do país, aprovaram por unanimidade uma resolução que será enviada à associação patronal, ao Ministério da Educação e Ciência e a outras entidades. No documento, salienta-se, a dado passo, que "neste subsistema, os abusos relativamente aos horários de trabalho, a permanente violação de direitos laborais e profissionais, bem como os processos persecutórios, são frequentes, e os despedimentos coletivos são uma constante de há muitos anos a esta parte. Nos últimos, porém, sobretudo com a justificação da “crise”, estas situações têm vindo a multiplicar-se. Confirma-se, assim, que não estamos perante uma questão de boa gestão de recursos ou de sobrevivência do setor, mas de uma estratégia definida pelos operadores privados no sentido de manterem os elevados lucros de que nunca abdicaram."

Conferência por Manuela Esteves

O encontro teve uma breve sessão abertura, com a intervenção de Ana Simões, do Secretariado Nacional da federação ("a FENPROF não desiste do direito à negociação coletiva"), prosseguindo com a conferência "Ser Professor/a nos dias de hoje", por Manuela Esteves, Professora Auxiliar aposentada do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa e Doutorada em Ciências da Educação – Área de Formação de Professores.

A prestigiada investigadora deixou ao longo da sua reflexão vários apontamentos alinhados em sete "tópicos" fundamentais: 

  • Donde viemos? Onde estamos? Para onde queremos ir?
  • Um mundo de mudanças muito rápidas, empolgantes, dramáticas também
  • Um mundo onde se espera da educação tudo, muito, pouco ou... nada
  • Os pilares de construção da profissão: solidez versus corrosão
  • O trabalho dos professores no quotidiano
  • Profissionalismo e profissionalidade: uma (re)construção permanente
  • Uma agenda para intervir, exigir, lutar

Manuela Esteves analisou e comentou os elementos informativos extraídos dum estudo internacional (TALIS 2013, da OCDE) sobre a situação da educação e da profissão docente que envolveu 30 países.

Dos números apontados, destaque para os altos índices de formação dos professores portugueses, superiores à média dos profissionais dos países da OCDE. Outro item saliente: "é impressionante e esmagador" o número de horas que em média  integram o horário não letivo dos docentes portugueses, muito superior aos dos professores dos outros países da OCDE.

4 testemunhos expressivos

Após a comunicação de Manuela Esteves, foram apresentados quatro testemunhos de docentes, que revelaram experiências concretas e situações complexas ("exploração desenfreada", "desrespeito pelas leis", "atrocidades", "professores pau para toda a obra"...) vividas em escolas privadas:

  • João Maurício (SPGL), Colégio Santo André, Venda do Pinheiro, Mafra ("somos, na verdade, mão de obra muito barata");
     
  • Vitor Juvenal (SPRC), Instituto D. João V, Louriçal ("O grupo GPS destrui-nos os sonhos todos");
     
  • Fernando Carvalho (SPN), Colégio Internato dos Carvalhos, Porto ("Vivem-se neste subsistema de ensino realidades atentatórias dos direitos legais dos docentes, vivem-se ambientes de medo...");
     
  • Pedro Nunes (SPGL), Colégio Bartolomeu Dias, Santa Iria de Azóia, Loures ("Onde é que fica o tempo para estarmos com a família?", "muitos colegas têm medo de perder o posto de trabalho", "o corte de direitos foi uma imagem de marca da legislatura que agora vai terminar!").

Antes do intervalo para almoço houve debate na sequência da comunicação de Manuela Esteves e dos quatro depoimentos já referidos.

Contratação coletiva

Os trabalhos foram retomados numa sessão dirigida por António Caldeira, para analisar e discutir o tema "A contratação coletiva: importância e fragilidades. Contrato Coletivo de Trabalho em vigor". Registaram-se as intervenções de:

  • António Casimiro Ferreira, do Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra; 
  • Joaquim Dionísio, coordenador do Gabinete de Estudos da CGTP-IN, jurista, membro da Comissão Executiva da Central; 
  • Graça Sousa, coordenadora do Departamento do Ensino Particular e Cooperativo da FENPROF.

Casimiro Ferreira falou da necessidade de mobilizar os docentes e sublinhou que a negociação coletiva é um pilar fundamental da redistribuição, "neste momento atacado a grande velocidade".

Joaquim Dionísio referiu que o direito do trabalho é resultado direto da contratação coletiva. "Vivemos uma fase difícil, temos que reagir e temos que intervir bem", observou o dirigente da CGTP-IN.

Graça Sousa realçou que "o CCT assinado pela FENPROF não caducou". Pode vigorar, como demonstrou a dirigente sindical, "até setembro de 2017". A estratégia negocial então desenvolvida pela FENPROF foi, não só responsável, como resultou de um permanente contacto com os professores através de reuniões e consultas diversas. A FENPROF neste, como em todos os processos, negociais ou reivindicativos, está sempre do lado dos professores, de forma responsável, opondo-se a quem apenas pretende desvalorizar a sua qualificada atividade profissional. E procura sempre, em cada momento, gerar convergências que ajudem a tornar ainda mais ampla a luta.

Após aquelas intervenções, decorreu um período de debate, com comentários e pedidos de esclarecimento, colocados por Luis Saldanha, Sandra Paulo, Fernando Carvalho, Vitor Januário, Frederico Amador, entre outros. Em foco estiveram temas como a situação nas escolas privadas de ensino profissional, o processo de caducidade dos CCTs, a construção dum caminho para a construção dum novo CCT do ensino particular e cooperativo, a não existência de um estatuto de carreira no setor, a situação nos estabelecimentos de ensino superior privados, as tentativas de extinção de posto de trabalho por aumento do horário de trabalho do docente, entre outras matérias. / JPO