Internacional
Público, 19/10/2010)

Meio milhão de franceses nas ruas contra o projecto de Sarkozy

12 de outubro, 2010
Perto de meio milhão de pessoas afluiu (19/10/2010) ao princípio da tarde às ruas de mais de 200 cidades francesas, segundo os números do ministério do Interior, para se manifestar contra o projecto do Presidente Nicolas Sarkozy de atrasar a idade da reforma. / Jorge Heitor, Público, 19/10/2010
 
Teria sido, de acordo com os dados oficiais, um número ligeiramente inferior ao dos manifestantes de há uma semana, mas não deixou de haver violência, com a polícia de choque a recorrer a gás lacrimogéneo e a bastões nos seus confrontos com os que protestavam. E os sindicatos ainda não fizeram o seu balanço global, preferindo aguardar pelo fim da tarde.

Apesar de se tratar já da sexta jornada de greve geral em menos de dois meses, Sarkozy garantiu que o seu projecto irá por diante.

No entanto, o presidente do Senado, Gérard Larcher, adiou por um dia ou mais a aprovação final do projecto de lei que altera a idade da reforma. Esta nunca deverá verificar-se antes dos 62 anos e a pensão só será paga por inteiro a quem permanecer no activo até aos 67.

Se a guerrilha dos senadores de esquerda continuar para além de quinta-feira à noite, escreveu o jornal “Le Figaro”, Gérard Larcher prevê que a câmara alta do Parlamento continue reunida por todo o tempo que for necessário: sexta-feira, sábado ou talvez até mesmo domingo.

Ainda há centenas de emendas a encarar, pelo que já ninguém acredita agora na hipótese de uma votação antes do fim-de-semana.

Em Paris, às 15h00 de hoje (14h00 em Lisboa), 60.000 pessoas manifestavam-se, segundo um primeiro cálculo da polícia, significando isso um número em ligeira baixa em relação aos 65.000 que há uma semana tinham sido referenciados na capital. Mas os sindicatos falaram de 330.000 manifestantes, número idêntico ao de dia 12.

Antes de o desfile ter partido da Praça de Itália para os Inválidos, François Chérèque, secretário-geral da Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT), uma das oito que estão a trabalhar em coordenação, lançara um “apelo à calma”, para que ninguém cedesse a “provocações”.

Entretanto, terminada uma cimeira em Deauville, com o seu homólogo russo, Dmitri Medvedev, e com a chanceler alemã, Angela Merkel, o chefe de Estado anunciou que vai tomar medidas, nomeadamente contra o bloqueio das refinarias, e pediu a “responsabilidade do conjunto dos actores”.

"Compreendo a inquietação. Numa democracia, cada um pode exprimir-se, mas deve fazê-lo sem violência e sem excessos. Efectuarei, ao regressar a Paris, uma reunião para desbloquear um certo número de situações, porque há pessoas que querem trabalhar e não devem ser privadas de combustível”, declarou Nicolas Sarkozy à imprensa.

“Zelarei para que a ordem pública seja garantida. É esse o meu dever”, sublinhou, enquanto na capital o primeiro-ministro François Fillon se manifestava contra "a intimidação, o bloqueio e a violência”. Este último convocou para o seu gabinete, em Matignon, as principais figuras da indústria perolífera, dada a escassez cada vez maior de combustíveis.

Numerosos sectores da economia estão a ser afectados pelo braço-de-ferro entre os sindicatos e a cúpula do Estado. O jornal “Libération” descreve um país em “pé de guerra”.

Trabalhadores de refinarias e aeroportos, maquinistas de comboios, professores e outros cidadãos aderiram ao movimento grevista, tendo alguns manifestantes na cidade de Lyon incendiado carros e caixotes do lixo, ao mesmo tempo que recorriam às cadeiras das esplanadas para partir as montras dos bancos e de outros estabelecimentos.

A polícia usou gás lacrimogéneo e bastões para dispersar manifestantes em Nanterre, um dos subúrbios de Paris; e houve quem tivesse virado automóveis na localidade de Mantes-la-Jolie.

Os jornais não foram impressos ou distribuídos, devido à greve geral, apenas tendo mantido as suas edições online, enquanto os quiosques permaneciam fechados.

Ontem, numa sondagem CSA, 71 por cento dos franceses manifestaram o seu apoio e simpatia a esta jornada de protestos.

França em greve com o espectro de Maio de 1968

Por LUMENA RAPOSO
DN, 13/10/2010

Estudantes e operários estão apostados em fazer abortar polémica lei de Sarkozy

Milhões de franceses fizeram ontem (12/10) greve e saíram à rua num novo dia de protesto contra a lei do Presidente Nicolas Sarkozy que altera a idade da reforma. A participação neste protesto de alunos do ensino secundário e estudantes universitários fez lembrar a muitos o espectro de Maio de 1968, quando uma série de manifestações estudantis originou graves confrontos que quase fizeram cair o Governo do general De Gaulle.

Ao início da tarde de ontem, quando já 3,5 milhões de pessoas contestavam na rua, a nível nacional, a política de Sarkozy, o seu primeiro-ministro, François Fillon, garantia na Assembleia Nacional que o Governo está "decidido a levar até ao fim" a reforma em causa. Na véspera, o Senado aprovara, por 174 contra 159 votos, a idade mínima da reforma de 60 para 62 anos. Aprovado foi também o aumento de 65 para 67 da idade mínima para receber na totalidade a pensão de reforma.

Fillon aproveitou a ocasião para acusar a oposição de esquerda de "irresponsabilidade" por ter colocado "jovens de 15 anos na rua", numa alusão à participação de alunos e estudantes no protesto contra Sarkozy, que regista uma baixa na sua popularidade.

Para além da novidade da participação dos jovens estudantes ao lado dos seus professores, as greves foram ontem significativas em dois sectores estratégicos do país: os caminhos-de-ferro e a energia. A Sociedade Nacional dos Caminhos-de-Ferro revelou, a meio da tarde, que 40% dos seus funcionários estavam em greve - os sin- dicatos elevaram a fasquia para 54% - e que apenas um comboio de alta velocidade (em três) circulava entre Paris e a província. No que toca aos transportes aéreos, foram anulados 30% dos voos no Aeroporto de Roissy e 50% no de Orly, ambos em Paris - cidade cujos transportes paralisaram.

Por outro lado, 11 das 12 refinarias francesas aderiram à greve sem, no entanto, esta paralisação ter tido consequências no aprovisionamento do combustível. O movimento grevista poderá, porém, prolongar-se em algumas delas, assim como noutros sectores da sociedade, se Sarkozy não der sinais de recuo.

A esperança de que aconteçam cedências é partilhada por muitos que recordam como, em Dezembro de 2008, o poder abandonou um projecto de reforma então contestada no ensino secundário e, em 2006, renunciou mesmo a uma lei que já fora votada e que se prendia com os contratos temporários para os jovens.

"Sarko, vamos tratar da tua reforma", foi uma das palavras de ordem gritadas pelos milhares (330 mil, segundo os sindicatos) de manifestantes que desfilavam ao fim do dia em direcção à Bastilha.

Bernard Thibault, secretário- -geral da Confederação-Geral dos Trabalhadores (CGT), considerou o dia de ontem como o "mais forte" em termos de adesão à greve desde que começou o movimento de protesto contra a lei da reforma.

Nova greve de transportes foi já convocada para hoje. Outras greves poderão ocorrer até sábado, dia de novas manifestações.

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12 Out. 2010, 14:52
TSF
Braço-de-ferro em França. De um lado a mobilização nas ruas que está a ser considerada histórica, do outro a garantia do Governo de que o aumento da idade da reforma é para ir até ao fim.

No primeiro dia de greve geral e com os protestos em força nas ruas de várias cidades francesas, o primeiro-ministro já avisou que o governo chegou ao limite e não pode ceder mais no diploma que aumenta a idade da reforma dos 60 para os 62 anos, o motivo que levou pela terceira vez os franceses para as ruas nos últimos tempos.

Ainda na semana passada, o presidente Nicolas Sarkosy anunciou algumas alterações, que na altura foram considerados apenas pequenos retoques e que não chegaram para convencer os sindicatos.

Hoje, eles arrancaram com uma greve geral por tempo indeterminado. Os sindicatos ainda não avançam com dados, mas desde já dizem que esta é a maior jornada de luta de sempre em França.

Os números oficiais do Ministério do Interior apontam para uma mobilização até ao meio-dia maior que em protestos anteriores.

Em todo o país contam-se cerca de 500 mil pessoas nas ruas.

Só em Paris, a polícia estima que 65 mil pessoas estão a participar na manifestação.

Esta tarde, a TSF falou com Paulo Carvalho do jornal "Portugal Vivo", em Paris. Ele contou que se sente um certo clima de tensão e confirma a grande mobilização na cidade.

Na província, a cidade de Toulouse, viu desfilar esta manhã mais de 140 mil pessoas.

Este é o dia mais intenso de protestos. Desde o início das contestações, em Setembro.

Esperam-se mais de 240 manifestações ao longo de todo o dia de hoje em França.

A contribuir para estes números recordes está a adesão dos jovens nos protestos.

O primeiro-ministro francês veio já acusar a oposição de irresponsabilidade por incentivar jovens de 15 anos a saírem às ruas.

O que começou por ser uma greve dos transportes atingiu outros sectores. Em certas cidades as escolas asseguram os serviços mínimos.

O sector da energia está parado, 11 das 12 refinarias francesas estão em paralisadas.

A greve foi convocada por tempo indeterminado. Para já sabe-se que vai manter-se amanhã, embora o governo exclua novas concessões.

Há o receio de que as bombas de combustíveis possam secar, tendo em conta que logo no primeiro dia de greve geral quatro das cinco maiores refinarias estão paralisadas.

Destaque particular para os efeitos da greve no sector dos transportes com os aeroportos a serem bastante afectados, assim como os transportes públicos urbanos e os comboios em especial fora das grandes cidades.

A TAP cancelou por antecipação metade dos voos ontem e hoje usa aviões maiores para tentar minimizar os efeitos da greve em França.