Nacional

Depoimento de Mário Nogueira

10 de novembro, 2015

No novo tempo, apesar dos castigos

Estamos crescidos, estamos atentos, estamos mais vivos*

A equipa ministerial cujas funções duraram onze dias, só não será esquecida porque no hall da 5 de Outubro existe um painel com as fotografias dos ministros. Nele, Margarida Mano será recordada como a que, nos tempos recentes, desempenhou funções durante menos tempo. Para além da titular da pasta, ninguém conseguirá dizer, com exceção dos próprios, quem integrou a sua equipa. É significativo que, num governo em que foram mais as reconduções que as entradas, a equipa anterior tivesse sido substituída, com exceção na área do ensino superior e ciência, provavelmente por falta de disponíveis. As razões da não continuação, todos conhecemos e, a partir de agora, importante é preparar o futuro, neste tempo de exéquias de um passado que foi para além do prazo de validade.

Da nova equipa ministerial – como do governo que virá a seguir – são naturais as expetativas positivas por diversas razões. Por um lado, porque os problemas se agravaram de tal maneira que difícil seria não esperar algo mais favorável; por outro, porque não estamos perante mais um governo de maioria absoluta (ou relativa apoiada pelos mesmos de sempre), mas porque o governo do PS, que se constituirá, contará com o apoio parlamentar de PCP, PEV e BE, partidos cujas propostas vão ao encontro das posições defendidas por professores e comunidades educativas, tendo, todos eles, um histórico repleto de confrontos com a direita retrógrada e de estreita banda democrática que atacou com violência a Escola Pública e os seus profissionais.

Pelo que já se conhece, há medidas programadas que vão ao encontro das necessidades reais do sistema educativo em domínios que são fundamentais para que se reafirme a Escola Pública e valorizem os profissionais da Educação, independentemente da natureza pública ou privada da sua instituição. Espera-se a revogação de medidas que provocaram desemprego nos profissionais, que agravaram os seus níveis de precariedade e instabilidade e que reduziram o rendimento do seu trabalho, congelando carreiras, cortando salários e aumentando brutalmente a carga fiscal. Quanto ao funcionamento das escolas e à qualidade do ensino, está anunciada a redução do número de alunos por turma, a procura de caminhos alternativos à municipalização, a reversão do rumo de empobrecimento curricular que tem vindo a ser seguido e a reescrita de um regime de avaliação dos alunos centrado em exames. Também a garantia de que todas as crianças terão oportunidade de frequentar a educação pré-escolar, de que os princípios da educação inclusiva serão respeitados e de que a ação social escolar será reforçada é absolutamente fundamental para que a Educação recupere, depois de uma década traumática, tendo de, nesse processo, serem envolvidos os seus profissionais.

No ano – 2016 – em que se completam 50 sobre a aprovação da Recomendação da OIT/UNESCO relativa ao Estatuto do Professor e 30 sobre a aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo, terá maior importância e elevado simbolismo confirmar a atualidade daqueles dois marcos incontornáveis para a Educação em Portugal. A FENPROF, no seu 12.º Congresso, assumirá aquelas duas referências como essenciais na projeção do futuro.

Quanto às pessoas que irão corporizar este novo programa alternativo ao anterior, nunca serão mais importantes que o projeto. Mas não desvalorizemos esse aspeto, para o bem e para o mal. Depois de uma década muito marcada por Nuno Crato e Lurdes Rodrigues, torna-se indispensável uma equipa que inspire confiança aos professores e tenha peso político. Uma equipa aberta ao diálogo, capaz de negociar e que a competência para a negociação também nela resida, não se deixando transformar em mera delegação das finanças. Os problemas que irá encontrar serão muitos e complexos, devendo estar preparada para lidar com eles, desde logo estabelecendo prioridades para a sua abordagem. Nesse sentido, o contributo da FENPROF já é conhecido, quer através do documento de 12 Medidas para concretização imediata, já amplamente divulgado, quer da Resolução do seu Conselho Nacional, que reuniu no passado dia 7 de novembro.

Sabemos, no entanto, que a vontade de mudança que existe em quem chega de novo é, muitas vezes, travada pela resistência de um aparelho administrativo (chefes de gabinete, adjuntos, assessores, diretores gerais, dirigentes de serviços, delegados regionais, responsáveis por serviços que deveriam ser autónomos e mais um ror de funcionários intermédios, incluindo até prestáveis assessores de imprensa), cheio de velhos vícios, dificulta novos caminhos. Só para dar dois exemplos, a forma como o diretor da DGEstE ou o presidente do IAVE se assumiram na Legislatura anterior, exacerbando competências, dificultou ainda mais um diálogo já de si difícil. Para não falar da forma como o MEC de Nuno Crato lidou com as questões jurídicas, servido por quem, sem limites, sequer éticos, preferiu o litígio à procura de soluções conformes ao quadro legal em vigor. Registámos o governante da Educação que, um dia, desabafou ser mais difícil desbloquear preconceitos e vícios internos que negociar com a FENPROF.

O tempo é novo e, por isso, não vamos esperar para ver. A FENPROF assumirá a responsabilidade de quem, conhecendo a situação e tendo propostas para a alterar positivamente, sempre com os professores e investigadores a seu lado, quer contribuir para resolver problemas e construir um futuro melhor. Portugal precisa e merece esse futuro.

 

No novo tempo, apesar dos perigos

A gente se encontra cantando na praça, fazendo pirraça*

[*Obrigado Ivan Lins pelas palavras]