Nacional
reflexão

O negrume da mão invisível de Adam Smith paira sobre as nossas cabeças

24 de julho, 2015

 “as ázimas cabeças a quem estas ideias aparecerem em sonhos premonitórios, 
encostam-se nos seus cadeirões de pele e esticam as pernas sobre a mesa”

 

A bolsa de contratação de escola faz a magia de retirar do concurso nacional (de critérios objetivos) um elevado número de ofertas para agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, sob a capa do contrato de autonomia ou Território Educativo Prioritário e com uma indumentária subjetiva.

Há 10 parâmetros sinuosos, subjetivos e violadores do princípio da igualdade (art. 13º da Constituição da República Portuguesa) ao valorar-se coisas como participação em projetos (houve aqueles que tiveram a sorte de lhe verem atribuído no horário, da escola onde ficaram, a participação nesses projetos), experiência em escolas TEIP (este critério é semelhante ao ter-se olhos azuis ou castanhos.

Considere-se apenas que um professor com 5 anos de experiência numa escola dita normal é preterido em função de um professor com um único ano de experiência, mas esse ano foi feito numa escola TEIP), a avaliação desempenho dos últimos 3 anos (outro embuste já que os professores contratados têm como avaliação máxima o Bom e manda-se para o caixote do lixo as avaliações anteriores, quando ainda era possível os contratados chegaram ao excelente), o nível de envolvimento na concretização da atividade no âmbito do Plano Anual de Atividades (qual é a escola que tem este registo?), entre outros.

Acrescenta-se a isto várias minutas que os professores devem enviar para as escolas onde trabalharam para verem confirmadas as informações que prestam neste concurso. É caso para dizer: senhores, há alguma escola que se lembre do que eu fiz há 10 ou 15 anos atrás? Na dúvida o mais certo é certificar-se ou se tivermos o azar de o esquecimento ser completo virmos de mãos a abanar. Mais, tendo lecionado em mais de 12 escolas diferentes espalhadas pelo país, teremos de pegar nas solas e pôr-nos a peregrinar e mendigar. Enquanto isso, as ázimas cabeças a quem estas ideias aparecerem em sonhos premonitórios, encostam-se nos seus cadeirões de pele e esticam as pernas sobre a mesa.

Este Ministério começou por fazer desaparecer dos currículos nacionais disciplinas como Educação Tecnológica e áreas curriculares não disciplinares como a Área de Projeto, o Estudo Acompanhado e a Formação Cívica. Passou a considerar-se disciplinas nucleares em detrimento das outras rotuladas de secundárias. Resultado: temos alunos que vomitam Português e Matemática e que não sabem medir e realizar um projeto (mecânico, elétrico, têxtil, etc.), o que era feito na Educação Tecnológica. É caso para perguntar se alguém sabe o que é a formação integral dos alunos?

Outro exemplo flagrante e profundamente discriminador é a norma travão da vinculação automática. Vincula-se professores com 5 anos de serviço e deixam-se de fora professores com 10 anos de serviço. Pergunta-se: é uma medida justa? Que diria a este respeito Gil Vicente? Certamente o destino seria a barca do inferno.

Financia-se o ensino privado e põe-se o público a pão e água, com o intuito de o descredibilizar para que o manjar dos Privados seja superior. A Constituição prevê apenas, no seu artº 75º/2, que o Estado reconhece e fiscaliza o ensino particular e cooperativo, não que financia. O dinheiro dos contribuintes nunca deveria servir para financiar o ensino privado que para além de obter o financiamento estadual (dinheiro dos contribuintes) é pago a peso de ouro pelos pais ricos.

Atrevo-me a dizer – pelos indícios e sinais – que há em Portugal uma ideologia de privatização de tudo e que o negrume da mão invisível de Adam Smith paira sobre as nossas cabeças. Assiste-se a uma transferência de competências para as Câmaras Municipais – altamente permeáveis aos interesses e influências locais e privadas (veja-se a autorização de outdoors publicitários de escolas privadas nas rotundas). Veja-se as ofertas das escolas privadas para angariar alunos (algumas chegam a oferecer a carta de condução), a publicidade nas rádios e ruas a escolas privadas. A publicidade é cara e quem a paga é o dinheiro dos contribuintes que ao invés de ser redirecionado para as escolas públicas vai parar às mãos ladinas dos privados. Há uma coisa fundamental que todos devemos perceber: privado é sinónimo de Lucro. Há fins lucrativos nas escolas privadas. Não prosseguem o interesse público. Ninguém, no seu perfeito juízo, pode dizer que prosseguem o interesse público. As instituições Particulares de Solidariedade Social sugam rendimentos àqueles que servem e aos contribuintes. Não haja ilusões. / Graciete Teixeira

Os interesses e ideologias de quem governa são privados,
prosseguem bolsos privados e não o Estado Social de Direito.