Nacional
Contra a mobilidade, pela defesa do emprego e da dignidade

A luta dos trabalhadores do ISS chegou a São Bento

12 de janeiro, 2015

ISS agiu à margem das leis ao publicitar as listas nominativas de trabalhadores afastados para a mobilidade especial

Provedor põe em causa dispensa de 700 funcionários

A luta dos trabalhadores do Instituto de Segurança Social (ISS), contra a "mobilidade", esteve, na passada terça-feira, 13 de janeiro, na Assembleia da República. 

Clique para ampliarForam vários os pedidos de assistência aos trabalhos parlamentares que incluiam a presença de responsáveis do Institruto e do próprio ministro da tutela, o centrista Mota Soares, mas acabou por ser dada a informação de que, alegadamente, por decisão da Presidente da Assembleia da República, a sessão não poderia ter assistência, devido ao elevado número de interessados.

Desde logo a FENPROF manifestou a sua indignação por esta decisão arbitrária que impede cidadãos portugueses de acompanhar in loco as audições parlamentares sobre tão importante matéria e decidiu concentrar docentes atingidos pela "requalificação" frente ao parlamento.  O que se passou dentro da AR foi acompanhado no exterior através de um estúdio móvel, com um écrã onde foi passando a transmissão do Canal TV Parlamento.

Luta e protesto também
nos tribunais


O ISS decidiu prosseguir com o que designa "processo de racionalização de efetivos", nos termos dos artigos 251.º e seguintes da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (LTFP), mantendo a declaração de desajustamento do pessoal constante do mapa de pessoal face às necessidades dos serviços, designadamente dependentes do ISS,IP (Segurança Social). Uma medida que continua a ser contestada pelos trabalhadores através de diversas iniciativas de protesto, mas também junto dos tribunais.

Em declarações à comunicação social, o dirigente sindical António Quitério revelou que a maioria dos docentes que trabalham no ISS, atingidos pela "mobilidade", vai recorrer individualmente para tribunal, quando forem notificados da colocação na requalificação.

Independentemente da decisão tomada pelo TAF de Coimbra (que decretou uma providência cautelar com efeitos suspensivos da decisão do Governo) e antes da apresentação da exigida resolução fundamentada pelo ISS, este instituto público, recorde-se, procedeu à notificação dos trabalhadores abrangidos, num claro desrespeito pela legalidade e pela suspensão de todos os atos relacionados com este processo.

O futuro de centenas
de trabalhadores em causa

O processo de requalificação no Instituto de Segurança Social (ISS) atinge 697 trabalhadores.

Luís Monteiro e também a presidente do ISS, Mariana Ribeiro Ferreira, lá foram confirmando que se trata de "uma situação difícil", mas recusaram-se a confirmar quantos trabalhadores serão colocados em requalificação, argumentando que o processo ainda não está fechado.

O vogal do ISS apenas adiantou que entre “aposentações, afectação a funções de chefia e nomeação de dirigentes para outros organismos" ocorreu uma redução do número de postos de trabalho previstos no mapa de pessoal entre o início do processo e o momento atual. Acrescentou ainda que, “até à conclusão do processo, há trabalhadores que solicitaram transferências para outros organismos”.

A audição ficou marcada por críticas dos deputados do PS, Bloco de Esquerda e PCP, que acusaram o Governo de estar a promover despedimentos, num clima de grande instabilidade no ISS. Os parlamentares do BE e do PCP mostraram a sua profunda preocupação pelo que se está a viver no Instituto e também a sua solidariedade com os trabalhadores afetados e com todos os outros que, no âmbito da Admnistração Pública, poderão vir a ser atingidos.

Canto de sereia...

Mariana Ribeiro Ferreira, que decidiu não se recandidatar ao cargo que ainda ocupa, reforçou por diversas vezes que “não se trata de um despedimento, mas de uma requalificação” e "justificou" o processo com um conjunto de processos que têm sido automatizados, libertando recursos.

Para tentar "provar" que não é um despedimento, anunciou que o INA (a entidade responsável pela gestão dos trabalhadores em requalificação) está já a preparar um programa de requalificação para os trabalhadores afectados e vai contactá-los em breve.

A deputada do PCP Rita Rato perguntou quantos desempregados com contratos emprego-inserção estão no ISS.. Mariana Aiveca acusou o instituto de não ter feito as diligências previstas na lei para a colocação destes trabalhadores noutros serviços, antes de avançar para a requalificação. Estas e outras questões ficaram sem resposta.

Audição

Entretanto, de manhã, o Bloco de Esquerda promoveu uma audição com os trabalhadores do ISS afetados pela requalificação, numa reacção ao fato de os funcionários terem sido impedidos de assistir à audição dos responsáveis do ISS e do ministro da Segurança Social. Apenas três funcionárias foram autorizadas a assistir às audiências na comissão parlamentar da Segurança Social e do Trabalho, tendo os restantes trabalhadores ficado ao fundo das escadarias da Assembleia da República.

Quem acredita em Mota Soares?

Ao fim da tarde, o ministro Mota Soares esteve na Comissão de Segurança Social e Trabalho. A passagem dos quase 700 funcionários do ISS considerados excedentários para o regime de requalificação motivou um requerimento potestativo do PS para ouvir  o ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social. Na troca de argumentos, o Governo acusou os socialistas de “não olharem para o passado”, lembrando que a mobilidade especial foi uma medida tomada durante o Executivo anterior, enquanto a oposição insistiu que se trata de um “despedimento com todas as letras” e de uma decisão “eticamente inaceitável”.

“O Partido Socialista governa como se não houvesse amanhã e está na oposição como se não houvesse ontem”, afirmou Luís Pedro Mota Soares no final de cerca de três horas de audição com os deputados da Comissão de Trabalho, acusando os socialistas de estarem a criticar um mecanismo criado pelo governo anterior e que, “na altura, era visto como reformista”. O ministro respondia esta tarde aos pedidos de esclarecimento dos deputados da oposição sobre o programa de requalificação que envolve quase 700 trabalhadores da Segurança Social, dizendo tratar-se de uma “reorganização de serviços” e não de “despedimentos”.

Para o PS, no entanto, a mobilidade especial e a requalificação “não são a mesma coisa”, uma vez que no regime de inicialmente criado pelos socialistas não era possível o empregador decidir unilateralmente a cessação do contrato de trabalho, estando essa decisão apenas nas mãos do trabalhador. Mostrando um powerpoint onde se podia ler os nomes e o ramo profissional dos mais de 600 trabalhadores abrangidos por este processo – entre professores, educadores de infância, técnicos de saúde, motoristas, telefonistas, alguns deles que se manifestavam às portas da Assembleia -, os deputados socialistas apontaram o dedo ao Governo por aquilo que consideram ter sido uma decisão “tecnicamente injustificada, politicamente errada e eticamente inaceitável”.

"Um despedimento com todas
as letras”

Acusando a Segurança Social de ficar “ameaçada” e “impossibilitada” de cumprir a sua função de dar resposta aos problemas e necessidades dos cidadãos, a deputada socialista Sónia Fertuzinhos deu vários exemplos de casos concretos, nomeadamente de uma docente da CPCJ de Évora que saiu no regime de requalificação e foi substituída “à pressa” por uma assistente técnica operacional, ou seja, com competências técnicas inferiores.

“Quanto poupa o ministério à custa da fragilização da segurança social pela diminuição dos recursos humanos e pela contratação de novos recursos a um preço mais baixo, por estarem a começar carreiras? O estado investiu nestas pessoas, competentes e com experiência, e esta a enviá-las para casa. Vai ser preciso voltar a investir na formação, quando o sr. ministro já tem isto tudo nos trabalhadores que está a mandar embora”, interrogou a deputada.

Também o Bloco de Esquerda e o PCP foram bastantes críticos do regime de requalificação em causa, lembrando a posição recente manifestada pelo Provedor de Justiça de que “não há fundamento suficiente” no estudo em que o Instituto de Segurança Social se baseou para decidir quais eram ou não os trabalhadores excedentários que deviam entrar no regime de mobilidade.

Para o deputado comunista Jorge Machado, “trata-se, sim, de um despedimento com todas as letras” e não de, como defende o ministro, uma oportunidade para os trabalhadores serem recolocados noutros serviços ou tutelas do Estado.

Recordando palavras
de Marco António Costa...

À semelhança do que tinha feito Mota Soares com o Partido Socialista, lembrando o passado, também o deputado do PCP repetiu o exercício lembrando uma declaração do atual porta-voz do PSD, Marco António Costa, feita no âmbito da discussão do Orçamento do Estado para 2013, onde dizia que na segurança social “não havia trabalhadores a mais, mas sim trabalhadores a menos”.

“Porque é que querem despedir trabalhadores que fazem falta? Deve ser para substituírem os trabalhadores com direitos por outros sem direitos, criando ao mesmo tempo milhares de estágios”, realçou Jorge Machado.

Do lado do PSD e do CDS, as intervenções foram sobretudo direcionadas para o Partido Socialista, que dizem estar a “fechar os olhos” ao facto de o regime de mobilidade ter sido iniciativa do anterior Governo socialista, e de defesa do mecanismo: “O Governo tudo fará para que não haja nenhum caso de despedimento”, disse o deputado Arménio Santos.

Foi pelo menos essa a mensagem que Mota Soares procurou passar durante a audição, embora poucos acreditem: “Não há um despedimento coletivo na segurança social”.  Mariana Aiveca, do BE,  "respondia" que “cessação do contrato de trabalho” era sinónimo de despedimento. Para Mota Soares, no entanto, a requalificação é apenas um “mecanismo para permitir que um conjunto de funcionários que se tornaram excedentários, devido à transformação e modernização dos serviços, possam ser utilizados noutros setores do Estado onde sejam precisos”. Registem-se as palavras do político. A realidade, sentida pelos trabalhadores, está carregada de apreensões, dúvidas e angústia. A luta e o protesto são o caminho. / Fotos: J. Caria


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