Nacional
Se todos os dias são bons para os governantes imporem políticas que esmagam Portugal e os portugueses, todos os dias serão bons para protestar contra eles

Entrevista ao Secretário Geral da FENPROF

13 de junho, 2014

Alguns comentadores e políticos comprometidos com o desastre em que envolveram Portugal, têm manifestado um aparente incómodo e dirigido críticas ao protesto que teve lugar no dia 10 de Junho, na Guarda, quando decorriam as iniciativas oficiais do Dia de Portugal.
A esse propósito, entrevistámos o Secretário-geral da FENPROF, que, na qualidade de membro da Coordenação do SPRC, esteve presente. E foi precisamente com base no que alguns têm, deliberadamente, afirmado, que dirigimos algumas perguntas a Mário Nogueira. As respostas são imediatas e, da entrevista, resulta uma ideia muito clara: Se todos os dias são bons para os governantes imporem políticas que esmagam Portugal e os portugueses, todos os dias serão bons para protestar contra eles. E um compromisso: Por Portugal e os portugueses, continuaremos a lutar, sempre e em todas as oportunidades, contra este governo e as suas políticas, disso podem estar certos.

 

Eventualmente, por falta de melhores argumentos, há quem tenha relevado o facto de os manifestantes não terem respeitado o Presidente da República quando se sentiu indisposto. É justa esta acusação?
Mário Nogueira (MN): Essa é conversa de quem não tem outros argumentos, porque não existem, de facto. Onde estavam os que protestavam não se ouvia a intervenção do Presidente porque não havia som. Talvez para não interferir na transmissão televisiva, desligaram as colunas nesse local e, portanto, nunca se ouviu o que disse o PR nem o que aconteceu enquanto esteve indisposto. Aliás, nem sequer se aperceberam da indisposição do Presidente. Estávamos a centenas de metros e quando, ao longe, vimos que não estava no palanque, o que todos pensaram (manifestantes e outras pessoas que assistiam) é que já tinha concluído a intervenção.


Mas chegaram a saber da indisposição?
MN: Soubemos praticamente quando o PR regressou para concluir a intervenção e porque alguns jornalistas que, entretanto, chegaram junto a nós, nos informaram disso. Afirmar que houve desrespeito por Cavaco Silva quando se sentiu indisposto não é verdade e para quem acompanhou o que foi dito por alguns de nós, no final, quando entrevistados por canais televisivos, isso ficou muito claro. Mas essa é a parte que, à gente de direita, interessa apagar. Aliás, alguma dela tem quase meio século de prática a apagar informação.

Há até quem diga que viu sorrisos no rosto de manifestantes após o desmaio do Presidente…
MN: Como é óbvio, os sorrisos nada tinham a ver com a indisposição do PR, pois, como disse antes, não sabíamos disso. As imagens que passaram, em que sorrimos, são de momento diferente, o seu alinhamento é que não terá sido ingénuo. Foram imagens recolhidas quando os manifestantes chegaram e em que gente conhecida dos partidos do governo, bem como alguns polícias à paisana – no final confirmámos serem polícias, porque se identificaram, e temos fotos – se dirigiram aos manifestantes com provocações e insultos. Provavelmente queriam uma reação violenta dos manifestantes e não tiveram. Limitámo-nos a sorrir para evitar que se criasse ali um ambiente mais complicado, que eles desejavam. Foi essa a nossa opção e terá sido a mais correta. Não queríamos confronto, pois não íamos para isso. Depois, como passaram nas televisões, isso já não foi da nossa responsabilidade.

Há também quem diga que houve desrespeito pelas Forças Armadas. Foi o que aconteceu?
MN: Quem esteve no local ou acompanhou em direto o que aconteceu, viu que durante a revista às tropas e na parada militar nunca houve qualquer protesto. Aliás, se os militares e as forças policiais têm sido desrespeitados é pelo governo, que também lhes tem cortado salário, agravado condições de trabalho, aumentado a idade da reforma, imposto cortes orçamentais violentíssimos e aplicado sanções disciplinares quando protestam contra o governo e as suas políticas. Os próprios militares ali presentes, os que estavam em trabalho, nunca consideraram haver desrespeito, pois muitos conversaram com quem protestava, revelaram acordo com o protesto, pois as razões são também suas e diziam ter pena de não poderem estar ali ao nosso lado.

Quais as principais razões do protesto realizado?
MN: Precisamente porque sendo Dia de Portugal, ele não pode ser de tréguas aos portugueses que, no governo, estão a destruir a vida de tantos outros que trabalham, seja na Administração Pública ou no setor privado. Exigiu-se ali a demissão do governo e outra política que deixe de penalizar os mesmos de sempre. Estavam lá os governantes que são os principais responsáveis pelo que está a acontecer a Portugal e, por isso, foi o local adequado para protestar contra os cortes nos salários e pensões, a tremenda carga fiscal, o agravamento dos horários de trabalho e demais condições de trabalho dos professores, os violentos cortes orçamentais na Educação, mas também na Saúde e Segurança Social, os despedimentos que atingiram milhares de professores nos últimos anos, a mobilidade especial que se aplicará já no próximo ano, os atentados sistemáticos à Democracia e à Constituição da República...

Medidas que estão para continuar?
MN: Sim, ainda ontem o governo aprovou novos cortes e o fim da tabela remuneratória dos professores, integrando-os na tabela geral e retrocedendo assim mais de 25 anos. E há o ataque fortíssimo à Escola Pública que o governo quer privatizar ou entregar às câmaras municipais, incluindo os professores. E também já anunciaram um corte de mais 6.700 Milhões, até 2019, em cima de tudo o que já cortaram. Percebo que queiram calar a denúncia e o protesto, mas não o conseguirão. No Dia de Portugal, como em quaisquer outros, não há razão para que os portugueses calem o protesto, eventualmente por, nesse dia, sermos todos iguais e irmãos, porque não é assim. Os irmãos não esmagam os outros irmãos como os governantes esmagam Portugal e os portugueses todos os dias.

E o PR tem também responsabilidades nestas políticas e neste caminho que tem sido imposto a Portugal?
MN: Claro que sim. Acaba de promulgar, por exemplo, a Lei que contém o Regime Geral do Trabalho em Funções Públicas, que, entre outras malfeitorias, irá permitir os despedimentos. Tem promulgado todas as alterações às leis do trabalho e, este ano, nem sequer tinha requerido a fiscalização da constitucionalidade do Orçamento do Estado. Veremos o que fará em relação às novas medidas que estão anunciadas. O Presidente da República não está acima dos protestos, como não está qualquer chefe do Estado. Repare-se em Espanha, o protesto de que tem sido alvo o rei. Fez mal o jovem Alberto Martins, hoje deputado e líder parlamentar do PS, por questionar diretamente o PR, em 17 de abril de 1969, numa sessão solene na Universidade de Coimbra? Também era um dia especial e uma sessão solene e tratava-se do PR... O que o presidente já deveria ter feito era demitir o governo e convocar eleições antecipadas, pois é clara a oposição da maioria dos portugueses ao atual governo e às suas políticas.

Portanto, o protesto irá continuar?
MN: Claro que sim. E temos já dois grandes protestos que a CGTP convocou para o Porto e Lisboa. É curioso, mas também esclarecedor que ninguém tivesse contestado os humoristas que, na sequência do desmaio de Cavaco Silva, brincaram com a situação. Ninguém contestou porque era a brincar...
Por isso, parece-me que o que tem deixado tanta incomodidade em alguns comentadores e outros apoiantes do atual governo, não foi o facto de se protestar ali junto do PR, mas o facto de ser a sério. Isso é que os preocupa, pois não querem que se proteste a sério, para poderem, a sério, prosseguir esta política que nos esmaga todos os dias. Mas podem crer que será a sério que continuaremos a combater tais políticas e tal governo. Por Portugal e os portugueses, continuaremos a lutar, sempre e em todas as oportunidades, contra o que nos estão a fazer, como tantos, em condições mais difíceis, lutaram antes de 1910 ou 1974, para só ficarmos pelo século passado. Lutaremos! Disso podem estar certos.