Nacional
Mário Nogueira no 10º Congresso do SPM

Reagir e protestar é o caminho!

06 de maio, 2011

Intervindo na sessão de abertura do 10º Congresso do Sindicato dos Professores (SPM), que decorreu no Funchal (6 e 7 de Maio), o Secretário Geral da FENPROF afirmou a dado passo: "Neste tempo tão difícil e complexo, o nosso pior inimigo seria o silêncio e a desistência. Reagir e protestar é o caminho, sob pena de, involuntariamente, nos colocarmos do outro lado, do lado dos que, há anos, eliminam, restringem, congelam, agravam, criam instabilidades, atacam impiedosamente e procuram convencer-nos que os problemas no ensino são culpa dos professores, na saúde culpa dos médicos e enfermeiros, no país, dos trabalhadores. Sob pena de nos colocarmos, sem querermos, do lado dos que provocaram mais de 700.000 desempregados que, já se sabe, este ano aumentarão 100.000, provocaram uma precariedade que atinge 1/4 dos trabalhadores, provocaram mais de dois milhões e meio de pobres e excluído, atiraram 23% das crianças para a pobreza!"

Intervenção

Inicia-se agora mais um congresso, o décimo, do SPM. Um congresso que é parte importante do património sindical desta região autónoma, mas também do movimento sindical nacional e, em particular, da FENPROF.

É um congresso diferente e que nos habituou ao melhor. À intervenção sindical junta-se a intervenção pedagógica e essa mescla, em tempos como os que vivemos, é ainda mais importante, pois demonstra que, apesar dos ataques violentos e furiosos a que professores e educadores, como todos os trabalhadores, têm estado sujeitos; apesar dos ataques violentos e furiosos a que a Escola Pública, como os demais serviços públicos, tem estado sujeita… o movimento sindical dos professores que constitui esta importante força que nos une e dá pelo nome de FENPROF não perde o sentido construtivo que tem e quer manter na sua acção. Uma FENPROF, nesta região chamada SPM, que resiste, insiste e persiste em construir por ter esperança no futuro. A esperança é o que nunca podemos perder, sob pena de perdermos convicções, combatividade, determinação, capacidade de ser parte activa. Enquanto há esperança há futuro; nós temo-la, daí o nosso compromisso com quem não desiste.

Este congresso realiza-se a um mês de um momento importante para o país: as eleições legislativas de 5 de Junho. Eleições que se realizam com os portugueses entalados entre duas troikas – uma que impõe (FMI/UE/BCE) e outra que se prepara para aceitar (PS/PSD/CDS) –, troikas essas que se entendem em torno de medidas se traduzem em mais sacrifícios para os do costume.

É um momento difícil em que a muitos, sentindo-se esmagados ou enganados, apetecer-lhes-á desistir e, claro, ceder, reprimindo a sua própria revolta… não pode ser assim! Não nos podemos perguntar que força é essa que nos põe de mal connosco!

Neste tempo tão difícil e complexo, o nosso pior inimigo seria o silêncio e a desistência. Reagir e protestar é o caminho, sob pena de, involuntariamente, nos colocarmos do outro lado, do lado dos que, há anos, eliminam, restringem, congelam, agravam, criam instabilidades, atacam impiedosamente e procuram convencer-nos que os problemas no ensino são culpa dos professores, na saúde culpa dos médicos e enfermeiros, no país, dos trabalhadores. Sob pena de nos colocarmos, sem querermos, do lado dos que provocaram mais de 700.000 desempregados que, já se sabe, este ano aumentarão 100.000, provocaram uma precariedade que atinge 1/4 dos trabalhadores, provocaram mais de dois milhões e meio de pobres e excluído, atiraram 23% das crianças para a pobreza!

Esses são, e não nós, os verdadeiros causadores da crise que o país e os portugueses vivem. Foram eles que, PEC após PEC, OE após OE agravaram os problemas tomando medidas mais duras para resolverem os problemas criados pelas anteriores medidas muito duras. São eles que criaram condições para que, agora, perigosamente, esteja a ser posta em causa a própria independência e soberania nacionais, querendo submeter-nos ainda a mais restrições e austeridade decretadas por alegados salvadores que olham com cifrões nos olhos para a nossa crise.

A hipocrisia dos que nos governam é, a todos os títulos, reprovável. Quem ouviu Sócrates na terça-feira percebeu que ele disse como não iriam ser roubados os portugueses, mas omitiu como e qual a dimensão da ingerência e do novo do roubo que aí está! Lamentavelmente, Sócrates optou pela campanha eleitoral e não pelo esclarecimento dos portugueses. Catroga seguiu-lhe o exemplo. Ambos branqueiam as medidas para justificarem o acordo dos respectivos partidos.

São esses, os que continuam a enganar-nos, que também nos querem convencer de que a culpa é nossa, pois vivemos acima do que podíamos e, por esse motivo, deveremos sujeitar-nos a mais e maiores sacrifícios, directa ou indirectamente incidentes no rendimento do nosso trabalho, numa espécie de penitência face a um alegado pecado mortal cometido, situado algures entre a gula e a luxúria!

São esses que apelam a um entendimento em torno de uma solução única por, dizem, estarmos todos do mesmo lado. Não estamos! E não estamos porque há um lado em que estão os que têm servido os interesses de poderosos que, porque o são, têm conseguido ganhar muito com esta crise e por ganância querem lucrar ainda mais. Definitivamente, não estamos desse lado, mas do lado dos que, vítimas das troikas:

- Ficarão desempregados por força da redução das contratações;

- Sairão da Administração Pública, devido à redução de 1% ao ano, até 2014, de trabalhadores dos quadros. Serão cerca de 5.000 docentes a menos;

- Terão os seus salários congelados até 2013, inclusive;

- Terão as carreiras congeladas por mais dois anos para além deste, totalizando um roubo de 5,5 anos de tempo de serviço;

- Verão os seus salários líquidos reduzidos pela via fiscal e o poder de compra degradado por força dos aumentos dos preços;

- Serão muito penalizados pelo agravamento do IRS, através da limitação ou eliminação de benefícios fiscais na educação, na saúde e na habitação;

- Verão aplicada a taxa máxima de IVA (23%) a bens a que hoje se aplica a taxa reduzida de 6%;

- Terão os impostos municipais agravados para compensarem as reduções nas transferências de verbas para as autarquias;

- Serão atingidos por uma ainda maior redução da sua pensão, reduzida com a aplicação da designada taxa de redução remuneratória;

- Terão menos protecção na doença com a redução de 50%, em dois anos, do orçamento da ADSE;

- Pagarão taxas moderadoras e medicamentos que serão muito mais caras;

- Reduzirão o período de abrangência e o valor do subsídio de desemprego;

- Redução, nos próximos dois anos, de 400 milhões de euros no financiamento da Educação. A juntar aos 803 milhões de 2011, em 3 anos, o corte será de 1.200 milhões de euros;

- Terão custos acrescidos em bens que consomem, devido às privatizações da REN, EDP, GALP, TAP, Correios, entre outras;

- Devido a compromissos que já têm, serão alvo fácil do agravamento de juros bancários, electricidade, transportes ou do imposto sobre produtos petrolíferos…

São mais e piores medidas; exigirão de nós respostas novas e mais fortes, exigirão mais luta!

Ninguém duvida que, com ou sem PEC 4, o FMI já tinha feito contas a quanto ganharia com esta intervenção em Portugal. Eles vivem dessa agiotagem e já se sabe que, só em juros, Portugal irá pagar 8 mil milhões de euros. Ninguém duvida que, com ou sem PEC 4, esta União Europeia, cada vez menos social, não iria desperdiçar a oportunidade de impor regras que decorrem da sua cartilha neoliberal, com vista a derrubar alguns dos pilares que, na nossa lei fundamental, continuam a sustentar Abril! E ontem, finalmente, admitiu isso mesmo.

O PEC 4 já corresponde à entrada desta troika no nosso país que, com ou sem ele, assumiria essa entrada. Recordo que a comissão europeia afirmou, em 8 de Abril, a este propósito, que o PEC 4 era o ponto de partida de um programa de assistência que teria de ir mais longe… Estão a ir mais longe!

Nestes tempos difíceis que temos vivido, porém, nem todos têm perdido. A banca, mesmo quando ganhou menos, nunca ficou a perder, e o FMI ganhou sempre mais. Com a “ajuda” prestada aos dois países que já lhe caíram nos braços, o FMI consegue que os seus lucros, em 2011, aumentem 60,3%. Com a “ajuda” a Portugal conseguirá um resultado líquido de 520 milhões. Já a UE, pretende igualmente ganhar à custa dos nossos sacrifícios, mas quer mais. Quer atingir a matriz democrática da nossa organização social, tal como a define a Constituição da República Portuguesa.

O caminho para resolver a situação que Portugal vive poderia e deveria ser outro, mas os poderosos não deixam! Não nos atemorizam, pelo que não será por isso que deixaremo0s de os defender e lutar por eles!

Não nos deixemos enganar, colegas, nem que se desenvolvam em nós sentimentos de uma culpa que não temos. Eles são peritos na arte de ludibriar e aperfeiçoaram-se na demagogia e na mentira para se livrarem de responsabilidades que são suas e de culpas que não assumem.

Continuaremos a exigir que o Estado cumpra a sua função social, pois pugnamos por uma sociedade mais solidária. Não é verdade que menos Estado signifique melhor Estado e, aliás, é curioso verificar que são aqueles que mais violentamente combatem o Estado que, permanentemente, mais dele exigem. O que se passa, no nosso país, com os colégios privados é disso bom exemplo. Criticam o Estado por financiar escolas públicas, mas exigem que seja este a financiar, de forma bondosa, as escolas privadas. Ou seja, o Estado, com o nosso dinheiro, deveria deixar de garantir os direitos de todos para satisfazer os interesses de apenas alguns. Não aceitaremos esse caminho e estaremos contra os que, à custa de uma alegada liberdade de escolha, mais não querem do que destruir a Escola Pública transformando-a, não na resposta para todos, mas numa alternativa de segunda categoria para os pobrezinhos, para os que têm dificuldades de aprendizagem e não contribuem para as estatísticas do sucesso ou para as regiões desertificadas onde não tem interesse investir no mercado da Educação.

Colegas,

Chegados que estamos ao final desta curta legislatura, o balanço possível não se pode limitar apenas a estes dois anos, mas aos seis de governação Sócrates… o conjunto é extremamente negativo, tanto no plano económico, como social ou laboral… e também na Educação. Sublinhe-se, por norma com o aval, explícito ou não,  dos partidos a sua direita.

Nós, professores, chegámos aqui com as carreiras congeladas, os salários reduzidos, a estabilidade perdida numa elevada taxa de precariedade, os horários de trabalho a desrespeitarem, em absoluto, as mais elementares normas da actividade pedagógica… As escolas perderam financiamento, perderam horas para se organizarem e para desenvolverem os seus projectos próprios, perderam autonomia com a gestão imposta, a conflitualidade entre pares e no seio da comunidade educativa não se atenuou, a escola não está mais inclusiva, antes excluiu milhares de alunos com necessidades educativas especiais a quem foram retirados os apoios no âmbito da Educação Especial, as famílias, confrontadas com uma crise que as empobrece, vêem-se sem meios para suportarem os custos acrescidos da educação dos seus filhos e, apesar disso, foram reduzidos os apoios sociais.

Como se não bastasse, ao contrário dos países em que o sucesso é, de facto, a imagem que marca, por cá, constroem-se mega unidades orgânicas, que o FMI manda prosseguir, onde a relação se torna mais impessoal e a organização menos pedagógica ao mesmo tempo que se encerram todas as escolas com menos de 21 alunos. Comparações, apenas duas: na Finlândia só 2% das escolas têm mais de 600 alunos; ao nosso lado, na vizinha Extremadura espanhola, as escolas encerram quando baixam dos 5 alunos e reabrem aos 7. São diferenças que explicam muito quando se procuram outras comparações…

Como explicar, então, que os governantes falem de resultados que, asseguram, reflectem menos abandono e mais sucesso e isso não nos satisfaça? É que todos sabemos como se obtêm… muito à custa de manipulação e de medidas que se reflectem nas estatísticas, mas não no sucesso real. Isso é mau porque, podendo fazer brilhar o presente, a artificialidade do brilho faz perigar o futuro. E é o futuro a principal construção da escola!

Aqui, na Região Autónoma da Madeira, temos verificado, as coisas estão cada vez mais semelhantes ao continente. Os governantes parecem gémeos, ora desavindos ora inseparáveis, mas cujos genes não enganam: no que é essencial agem da mesma forma. A organização da escola assemelha-se, a relação com os docentes não difere, as respostas educativas são próximas e tudo isto porque a natureza das políticas é a mesma. É natural que estejamos contra e movamos um forte combate a tais políticas, na certeza de que aquilo que combatemos no continente não passa a ser positivo nas regiões autónomas, e o mesmo para o contrário.

Avaliação do desempenho

Uma nota sobre o que se passou recentemente, no continente, com a avaliação de desempenho dos docentes. Derrotado, sem apelo nem agravo, no terreno do jogo democrático, o governo, com o apoio de quem deveria comportar-se com isenção, por ser árbitro, foi ganhar na secretaria. Ou seja, num tribunal que, curiosamente, em três situações semelhantes anteriores, decidiu de outra forma. Há quem diga que há por ali política a mais e constitucionalidade a menos… não sei se é assim, mas às vezes parece.

Isabel Alçada gritou aos sete ventos tratar-se de uma vitória. Será para si! Afinal as duas ministras da Educação da era Sócrates clamaram sempre vitória de cada vez que conseguiram infringir derrotas à Educação e não foi preocupação sua, em muitos momentos, que tal significasse ficarem de costas voltadas para os professores… fracas vitórias, estas! Até porque, neste momento e em relação ao modelo de avaliação que ainda vigora temo os dias contados. Aquilo já não é nada, excepto para quem, por teimosia e cegueira, pretende levá-lo até ao fim, sejam quais forem as consequências.

Colegas,

Hoje, mais do que nunca, se compreende que a luta para exigir alternativas é de todos, logo também dos professores e educadores.

O tempo é de crise mas, por ser assim, é necessário que se valorize o trabalho, que se valorize o colectivo, o que é de todos, que se reforcem solidariedades. Será esse o caminho que continuaremos a trilhar. Aqui o SPM, no todo nacional a FENPROF e a CGTP-IN serão espaços de resistência, de luta e de avanços.

A nossa acção será desenvolvida nos mais diversos planos: no negocial, no jurídico, no institucional, mas sempre com a consciência de que os ganhos mais relevantes se obterão através da acção reivindicativa, desequilibrando, para o nosso lado, a correlação de forças.

Continuaremos conscientes de que não são as políticas prosseguidas em particular nos últimos anos que servem o país. Continuaremos sem nos resignarmos a inevitabilidades que o não são; continuaremos vivos, actuantes, conscientes de estarmos do lado certo, de termos razão, de nada mais querermos que não seja a vida digna a que temos direito.

O tempo não é silêncios, colegas, embora não falte quem queira silenciar-nos por esmagamento… mas não conseguirão. O tempo é de denúncia, de protesto, de exigência… o tempo é de construirmos alternativas! Estamos disponíveis para isso porque outra sociedade é desejável e possível se soubermos transformar esta, provocando-lhe mudanças verdadeiras. No próximo dia 19 de Maio, voltaremos à rua para dizer isso mesmo

É claro que, como refere o vosso lema, não é fácil, pelo contrário, é muito difícil ser professor num tempo e numa escola de incertezas, tão difícil como ser cidadão num tempo e numa sociedade com tantas inseguranças; compete-nos a nós, no entanto – e enquanto professores temos responsabilidades acrescidas nessa tarefa –, transmitir confiança e renovar a esperança num futuro melhor. Com palavras, certamente, mas com o nosso exemplo de combatividade e determinação.

Vivam os professores e educadores portugueses!
Vivam a FENPROF e a CGTP - Intersindical Nacional!
Viva o Sindicato dos Professores da Madeira!

Desejo-vos um óptimo Congresso.
Mário Nogueira