Nacional
A escola pública em destaque

Mário Nogueira em diálogo com jornalistas nas últimas semanas

16 de junho, 2016

O Secretário Geral da FENPROF respondeu a um conjunto de perguntas que lhe foram dirigidas por jornalistas (nacionais e estrangeiros) em situações diversas nas últimas semanas. Esta síntese, o seu conteúdo e oportunidade merecem divulgação, tendo, até, em conta a proximidade da Marcha em Defesa da Escola Pública e a pressão que os operadores privados e os interesses económicos no mercado da educação farão nos próximos dias para desmobilizar, contrainformar e desmobilizar.

Sobre o envolvimento da FENPROF na Marcha e importância da iniciativa

Mário Nogueira (MN): A FENPROF integra, há muito tempo, um amplo movimento da sociedade portuguesa que defende a Escola Pública de qualidade, como escola de todos, para todos, inclusiva e democrática. Uma escola que, por ter esta matriz democrática, é fator de igualdade de oportunidades e promotora de progresso e desenvolvimento económico, social e cultural. Num momento em que a Escola Pública tem vindo a ser posta em causa, a FENPROF não poderia deixar de unir a sua voz a quantos defendem a Escola Pública que a Constituição da República Portuguesa obriga o Estado a promover. 

De resto, não se trata de um corte de financiamento de escolas particulares. O que aconteceu foi que o Estado Português, obrigado pela Constituição da República a promover uma rede de estabelecimentos públicos que satisfaça as necessidades de toda a população, não conseguiu dar essa resposta universal e, então, contratualizou com colégios privados a complementaridade da resposta. Tais contratos deveriam ter durado apenas o tempo em que fossem necessários, porém, governos sucessivos acabaram por ser cúmplices de uma situação que sendo ilegal se foi arrastando. 

A FENPROF sempre denunciou essa prática. O que o atual governo fez foi, simplesmente, cumprir e fazer cumprir a lei, nada mais que isso. Uma lei que, infelizmente, outros não cumpriram como deveriam ter feito.

Sobre  a forma como o Estado  intervém no apoio ao ensino privado

MN: Existem diversos tipos de contratos: os contratos simples, que são de apoio às famílias; os contratos de desenvolvimento que são para resposta em creches e na Educação Pré-Escolar onde a rede pública é escassa; os contratos de patrocínio, para respostas de outro tipo que o público tem dificuldade em dar (por exemplo o ensino artístico especializado vive destes contratos porque apenas há 7 conservatórios públicos no país, sendo mais de 100 particulares e cooperativos que são financiados através destes contratos); os contratos de associação que são estes que o Estado celebra para dar resposta educativa em áreas onde a resposta pública é insuficiente e apenas enquanto assim se mantiver. Foram apenas estes últimos contratos que mereceram um corte e de apenas 21% do total.

Das 1.720 turmas que eram financiadas, 374 deixaram de o ser por não ser necessário. Portanto, como se vê, todo o barulho que os colégios têm feito é por bem mais do que apenas este corte. O que pretendem é cavalgar a Educação e poderem mesmo levar ao encerramento de escolas públicas, como já afirmou a líder de um dos partidos políticos da direita parlamentar, o CDS.

O financiamento público de colégios privados decorre essencialmente da insuficiência da resposta pública. Apenas no caso dos contratos simples isso pode não acontecer, pois esses são contratos feitos com as famílias e, por isso, já um bocado semelhantes ao “cheque-ensino”, de que nós discordamos profundamente.

Sobre a qualidade da Escola Pública

MN: A Escola Pública em Portugal foi aquela que formou a geração mais qualificada do país que, infelizmente, devido às medidas de austeridade impostas foi obrigada a emigrar em grande número. É uma resposta de qualidade e há estudos no nosso país que confirmam que o desempenho dos alunos provenientes de escolas públicas, no ensino superior, é mais positivo que o dos que provêm de colégios privados.

É uma escola que recebe todos os alunos (por exemplo, 87% dos alunos com necessidades educativas especiais estão nas escolas públicas), mas é uma escola que foi muito castigada pelos governos de direita que governaram o país nos últimos quatro anos. Os cortes orçamentais foram fortíssimos, o número de professores foi reduzido em mais de 20%, apesar de os alunos só terem decrescido 8%. Foram eliminadas disciplinas. A gestão não é democrática e o diretor, órgão unipessoal, é também presidente do órgão pedagógico. Portanto, quando defendemos a Escola Pública não afirmamos que está tudo perfeito, mas mesmo com todas as suas imperfeições, a Escola Pública continua a ser a resposta que melhor serve Portugal e os Portugueses.

Sobre o problema do desemprego

MN: Os professores, naturalmente, temem pelo seu emprego, mas esse não é um problema de agora.

Nos últimos quatro anos, o governo de direita destruiu cerca de 40.000 postos de trabalho de professores, dos quais cerca de 2.000 no privado e os restantes 38.000 no público. O desemprego dos professores em Portugal, nos quatro anos de governação de direita, aumentou mais de 200%. Nos colégios privados, os patrões, para aumentarem os seus lucros, agravaram em 20% os horários de trabalho dos professores, em relação aos que lecionam no setor público. Eram iguais, mas de há ano e meio para cá os do privado foram agravados em 20%. Ora, bastava que esses horários de trabalho voltassem a ser iguais aos do público para que desta redução do número de turmas financiadas não resultasse qualquer despedimento.

Portanto, quando oiço os patrões e a direita a falarem do desemprego dos professores, sinto uma enorme indignação porque foram eles, uns e outros, que nos últimos anos provocaram inúmeros despedimentos de professores. e se quisessem, desta vez, poderiam evitá-los. Mas não querem porque para estes empresários da Educação o que conta, e quase só isso conta, é terem grandes lucros ainda que seja à custa da vida das pessoas.

Sobre a defesa da Escola Pública e a Marcha de 18 de junho

MN: Pelos dados que nos chegam será uma grande Manifestação. E é necessário que o seja, uma manifestação de cidadãos que defendem a Escola Pública, uns professores e outros não. Uma manifestação em que os participantes não irão sob pressão, como acontece com as dos colégios. Uma manifestação que tal como a petição que entregámos no Parlamento com mais de 70.000 assinaturas, será maioritariamente de cidadãos maiores e não de crianças.

Penso que uma grande Manifestação em defesa da Escola Pública criará dificuldades a quem pretende desvalorizar e diminuir a Escola Pública e será igualmente um aviso à direita, caso, no futuro, volte a governar e pretenda continuar o projeto que agora tem, de desmantelamento da Escola Pública de qualidade e matriz democrática.