Nacional

1º Ciclo

05 de maio, 2016

Caros delegados,

Nos últimos anos sucessivos governos tomaram muitas medidas que prejudicaram e condicionaram gravemente as aprendizagens dos alunos do 1º Ciclo.

A falta de investimento neste sector de ensino e a aplicação de medidas que têm procurado sobretudo reduzir gastos, ainda que daí decorram graves quebras de qualidade do ensino num momento fulcral da vida escolar das crianças, foram uma constante, com governos a irem bem além da troika nos cortes que fizeram na Educação…

Porque há muito tempo que na FENPROF sentimos uma grande preocupação com o 1º Ciclo do Ensino Básico, realizámos em 2014 a IV Conferência Nacional do 1º CEB, sob o lema “Repensar a Escola, Dignificar o Professor, Respeitar a Criança”.

O diagnóstico e o caderno reivindicativo na altura apresentados mantêm-se (infelizmente) em quase tudo actuais. Os problemas mantêm-se e/ou foram substancialmente agravados, porque em vez de se criarem condições que favoreçam um desenvolvimento harmonioso, tudo tem sido ideologicamente feito para caminhar em sentido inverso: alterações curriculares e programáticas e metas de aprendizagem disciplinares desajustadas, exclusão de áreas curriculares não disciplinares, empobrecimento do currículo, encerramento de milhares de escolas, retorno das turmas com diversos anos de escolaridade, perda de apoios necessários a milhares de crianças, uma organização pedagógica desadequada com AEC e Oferta Curricular no meio da actividade lectiva, horários de trabalho (de professores e alunos) desregulados e pedagogicamente absurdos e errados, um regime de coadjuvação que numas (poucas) escolas existe e noutras (a esmagadora maioria) não – é substituição de docentes, nuns casos há monodocência, em outros pluridocência – conforme há ou não recursos e/ou vontade de fazer assim ou assado –, mega-agrupamentos que tudo esmagam e não funcionam, criação de mecanismos de selectividade social, um desrespeito enorme do poder político e de muitos dos chamados superiores hierárquicos em relação aos docentes deste sector…

A FENPROF elegeu este sector como uma das prioridades para este ano lectivo e decidimos fazer uma Campanha Nacional “1º CEB: Caminhos para a sua valorização” para travar e alterar o rumo de degradação que tem afectado este sector, e que seja também um grito de exigência para inverter esse trajecto.

Fizemos acções em todos os sindicatos da FENPROF, conversámos com professores, pais, encarregados de educação e autarcas. Denunciámos os problemas que nos afectam e concluímos, claro, que é urgente “dar a volta a isto” e travar e alterar este caminho que está a destruir o 1º CEB.

Entregaremos, ao Ministério da Educação e aos grupos parlamentares, um dossiê para que se abra um processo de negociação urgente que permita que apresentemos propostas dos professores que conduzam a soluções que alterem a situação muito negativa que se vive e conduzam à reorganização e valorização do 1º CEB e à melhoria das aprendizagens dos alunos.

Com uma nova maioria na Assembleia da República e um novo governo, abriram-se expectativas positivas. Acabou-se com o exame do 4º ano de escolaridade, medida que saudamos.

Em Fevereiro passado reunimos com os Secretários de Estado da Educação e apresentámos uma vasta lista de problemas que deverão ser resolvidos rapidamente:

- REGIME DE DOCÊNCIA - Há escolas em que a monodocência continua a ser a regra. Noutras, os professores de diferentes turmas permutaram entre si para a leccionação de Português e Matemática. Também pode haver coadjuvação. Em algumas escolas pratica-se, em outras não. Às vezes ficam na sala, com a turma, coadjuvante e coadjuvado. Noutras é substituição do professor titular de turma por um outro, transformando-se em pluridocência.

- HORÁRIO DE TRABALHO - O 1.º Ciclo é o único em que os docentes, ilegalmente, viram a pausa de actividade (intervalo), excluída desse horário lectivo. Tal não acontece em mais nenhum sector de educação ou ensino. Daqui decorre que o efectivo horário lectivo dos docentes acaba por ser, no mínimo, de 27h30m semanais.

- HORÁRIO DE INGLÊS - Algumas escolas incluíram esta actividade nas 25 horas lectivas dos alunos, outras aumentaram-na em duas horas.

- HORÁRIOS DOS ALUNOS - Os alunos portugueses são dos que, no conjunto dos países da OCDE, têm uma mais forte carga horária de actividades escolarizadas: 25 ou 27 horas lectivas; e ainda mais algumas actividades escolarizadas integradas nas chamadas AEC.

- ORGANIZAÇÃO DAS AEC - Era suposto que estas actividades decorressem durante o chamado tempo de prolongamento de horário, ou seja, após as actividades lectivas dos alunos, mas muitas vezes, por dar jeito às entidades promotoras, estas actividades organizam-se de outra forma. Há alunos que têm “AEC” ao longo do dia, por vezes logo de manhã, sendo a sua actividade lectiva, curricular, empurrada para tempos que deveriam ser já de descontracção e de ocupação diferente, com todas as implicações negativas nas aprendizagens dos alunos e tem vindo a criar um maior número de situações de desconcentração no trabalho e de indisciplina.

- CONSTITUIÇÃO DE TURMAS - Foram encerradas milhares de escolas e, em seu lugar, construídos centros educativos ou centros escolares. Entre outras justificações por esta opção, destacou-se a possibilidade de, assim, acabar com as turmas de vários anos de escolaridade. Todavia, hoje é comum, em muitas escolas de média e grande dimensão, encontrar turmas destas, pois o seu desdobramento impunha a colocação de outro(s) professor(es). Desrespeito pela legislação relativa à inclusão de alunos com NEE na mesma turma também é frequente…

- GESTÃO E ORGANIZAÇÃO PEDAGÓGICA DOS AGRUPAMENTOS - São muitos os agrupamentos de escolas em que não há qualquer docente do 1.º Ciclo na direcção da escola.

O coordenador de estabelecimento por norma não tem dispensa de actividade lectiva e acumula, a toda a actividade inerente à sua função enquanto professor com a responsabilidade e o trabalho de coordenar o estabelecimento.

O Conselho de docentes e/ou o departamento é, muitas vezes, uma inutilidade. Há conselhos de docentes que chegam a reunir com quase uma centena de professores o que torna impossível desenvolver qualquer actividade relevante, para além da simples prestação de informações aos professores.

Diz-se que há sinais de que muitos dos problemas que afectam a Educação (e o 1º Ceb também, claro) se irão resolver.

Quero aqui dizer claramente que tenho muita dificuldade em interpretar sinais… quando não os vejo!

Já começou a sair legislação que, com ou sem sinais, nada modificou e manteve tudo ou quase tudo na mesma. Está aí um projecto de Despacho de Organização do Ano Lectivo que vai pelo mesmo caminho.

São exemplos recentes de sinais de sentido contrário e de oportunidades perdidas para, por exemplo, reduzir o número de alunos por turma e acabar com essa ilegalidade de a pausa de actividade (intervalo) não ser contada no horário lectivo dos docentes.

 Parece-me que já vai sendo tempo, neste tempo novo, de estes sinais se tornarem bem visíveis e de não se ficar à espera do fim da legislatura para que se cumpra o que foi prometido.

Como dizia António Aleixo: Vós que lá do vosso império/ prometeis um mundo novo/calai-vos que pode o povo/querer um mundo novo a sério.

Queremos a resolução destes problemas para construir uma escola pública de qualidade para todos. Em nome dos professores, claro, mas sobretudo em nome das crianças que são vítimas de políticas que as desrespeitam e condicionam negativamente o seu futuro.

VIVAM OS PROFESSORES E EDUCADORES E OS INVESTIGADORES PORTUGUESES!

VIVA A FENPROF!