Nacional

Intervenção de Júlia Vale

30 de abril, 2016

Caras e Caros Colegas,

A educação pré-escolar destacou-se após o 25 de Abril com o investimento feito na rede pública de jardins de infância promovendo o alargamento da oferta e do investimento na formação de educadores de infância e, em 1986, a FENPROF durante a elaboração da Lei de Bases do Sistema Educativo, defendeu a integração deste sector no sistema educativo português, o que viria a acontecer.

Anos depois, e após um percurso de luta pela dignificação deste sector de educação, com resultados visíveis, vimos ser publicada a Lei-quadro da Educação Pré-Escolar com a FENPROF a destacar-se no debate então promovido.

 

Em Junho do mesmo ano, o Ministério da Educação em parceria com o Ministério da Solidariedade e Segurança Social, afirmavam no Programa de Expansão da Educação Pré-Escolar:

“O Gabinete para a Expansão e Desenvolvimento da Educação Pré-Escolar está ao serviço de todos os cidadãos, sobretudo das crianças que mais poderão vir a beneficiar com uma educação pré-escolar de qualidade. Este projeto de expansão é de todos e para todos. É um verdadeiro projeto de cidadania e de participação democrática porque “Um bom começo vale para toda a vida”.

Nesse ano foram publicadas as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar constituindo um instrumento de trabalho fundamental para os educadores de infância no que respeita ao desenvolvimento da sua prática pedagógica e, posteriormente, O Perfil de Desempenho do Educador de Infância.

Estes foram alguns dos documentos legais fundamentais na consolidação da função da educação pré-escolar no sistema educativo.

Hoje, mais do que nunca, ser educador de infância é exercer a profissão acentuando o valor da componente educativa e assumindo-a como fundamental no processo ensino/aprendizagem que se inicia na educação pré-escolar, reforçando a prática pedagógica assente nas Orientações Curriculares. Recuperar a essência da docência neste setor de educação é recuperar uma forma de estar crítica e combativa. É perceber que a Educação exige participação, reflexão, exercício do sentido crítico. Por isso é tão importante, em tudo o que fazemos, saber recuperar a memória, valorizar a evolução ocorrida e também, mantermo-nos atentos e disponíveis para continuarmos a luta sempre que for necessário.

No VI Congresso em Braga, a FENPROF defendeu a obriga­toriedade da frequência da educação pré-escolar no ano imedia­tamente anterior ao ingresso na escolaridade obrigatória. Fê-lo com um único objetivo: garantir a todas as crianças o direito a poder frequentar no mínimo durante um ano a EPE.

Não depende apenas de nós, sabemos, mas é hoje claro que a promoção da igualdade de oportunidades continua a ser uma exigência ainda não alcançada e que nessa perspetiva, garantir a frequência neste sector pelo menos durante o ano anterior ao ingresso no 1º ciclo, é imperioso.

Afirma a Comissão Europeia que: "a educação pré-escolar tem o retorno mais elevado [entre todas as formas de educação] em termos dos resultados e da adaptação social das crianças". E continua, propondo  "Os estados membros deverão investir mais na educação pré-escolar como um meio efetivo de estabelecimento de bases para a aprendizagem ao longo da vida, prevenindo o abandono precoce e aumentando a equidade no acesso e nos resultados" (in, Documento de Trabalho da Rede Infância na Europa).

Neste sentido pode afirmar-se que a qualidade da oferta em estabelecimentos de idade pré-escolar e o alargamento da rede é uma necessidade reconhecida por todos os países da União Europeia visando:

  • Promover e desenvolver políticas consistentes para a idade pré-escolar para uma sociedade saudável, através da promoção do sucesso escolar e contribuindo para que as sejam crianças alegres.
  • Incentivar a que haja mais investigação nesta área com vista à melhoria da qualidade pedagógica para as crianças neste sector.

Valorizamos que recentemente em Portugal tenha sido reconhecida a necessidade de garantir e investir na universalização da frequência da educação pré-escolar para as crianças de 4 anos, no imediato, e de 3 anos. Mas afirmamos que compete ao Governo garantir que essa mesma universalização seja feita através da rede pública com a abertura de mais salas de jardins de infância públicas, garantindo uma efetiva universalização da oferta porque é essa a obrigação do estado…de um estado que tenha como prioridade a Educação das suas crianças e, assim, que tenha como prioridade o futuro do seu país.

São distintas as situações vividas hoje pelos educadores de infância nos seus locais de trabalho. Existe um agravamento acentuado das condições laborais dos docentes a exercer funções na rede privada ou solidária, sujeitos a trabalhar com um número de crianças por sala bem acima do limite estipulado pela lei, com uma componente letiva superior aos da rede pública e, muitas das vezes, desempenhando atividades que, claramente, não fazem parte do seu conteúdo funcional.

Não podemos esquecer também o que se passa com os educadores de infância a exercer funções em contexto de creche, que ainda não viram reconhecido como atividade docente o tempo de serviço prestado naquele tipo de estabelecimento. A FENPROF continuará junto dos sucessivos ministérios da educação a pressionar para que esta questão seja definitivamente resolvida e se acabe com esta situação de profunda injustiça.

No que à rede pública respeita, existem questões a carecer de resolução urgente. O diploma de gestão em vigor, entre todas as coisas graves que contém contribuiu para afastar dos órgãos de gestão os docentes da educação pré-escolar, sendo pontuais as situações que se conhecem onde isso não aconteceu. É entendimento da generalidade dos docentes deste sector que isto veio contribuir para alguma incompreensão relativamente às questões pedagógicas que o envolvem, prejudicando o trabalho desenvolvido, através da imposição de regras, fichas, e grelhas de avaliação que nada têm a ver com a especificidade da educação pré-escolar limitando-a naquilo que tem de essência. Também como já aqui foi afirmado, a imposição de um calendário escolar distinto do da restante educação básica e que acrescenta em cerca de 30 dias o período destinado à componente letiva, dificultando a articulação prevista entre ciclos hipotecando a participação dos docentes nos processos de avaliação inerentes ao agrupamento.

No país existem 3 calendários escolares distintos para a educação pré-escolar. O do continente, o da RAAçores, e o da RA Madeira que consegue ser mais gravoso do que o do continente.

Refere o calendário escolar da Madeira que as atividades educativas com crianças nas unidades de educação pré-escolar inseridas em estabelecimentos do 1.º CEB e nas escolas básicas integradas com educação pré-escolar têm início a 3 de setembro de 2015 e termo a 29 de julho de 2016. Significa isto que para os docentes da educação pré-escolar na RAM o ano letivo decorre ao longo de 11 meses com interrupções de 5 dias apenas por altura do Natal e da Páscoa..

A FENPROF não pode ficar indiferente a esta realidade e estará, com o SPM, ao lado dos educadores de infância em todas as lutas que entendam desenvolver no sentido de contrariar esta situação que demonstra uma evidente ausência de preocupação pedagógica.

Na Região Autónoma dos Açores a realidade é, felizmente, bem diferente. Os jardins de infância da rede pública de educação pré-escolar funcionam integrados nos estabelecimentos do 1º ciclo do ensino básico, situação que tem facilitado a aplicação de legislação comum aos dois setores como é o caso do modelo de gestão que ainda é de gestão democrática, e o calendário escolar que é o mesmo para os dois níveis de educação. Ali, a educação pré-escolar é gerida em simultâneo com o 1º CEB salvaguardando as suas especificidades em legislação própria.

A FENPROF continuará também a acompanhar as situações relativas à aplicação do ECD aos outros ministérios mantendo a exigência do respeito pelo seu articulado e não abandonará o combate contra a requalificação dos docentes do ISS, exigindo a sua integração efectiva e imediata sem qualquer outra contrapartida.

Vivem-se tempos de alguma insegurança num setor de educação que era reconhecido pelo seu inconformismo, atitude reflexiva, criatividade e relação privilegiada com a comunidade educativa.

Mas ser Educador de Infância é SER LIVRE, livre de pensamento, livre para gerir o currículo, e livre, porque não, para brincar educando porque, como dizia Pablo Neruda “Em minha casa reuni brinquedos pequenos e grandes, sem os quais não poderia viver. O menino que não brinca não é menino, mas o homem que não brinca perdeu para sempre o menino que vivia nele e que lhe fará muita falta.”

Vivam os professores!

Viva o 12º Congresso da FENPROF!