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JN entrevista Mário Nogueira (16/12/2013)

"Prova pode ser pretexto para criação de Ordem de Professores"

16 de dezembro, 2013

Mário Nogueira, Secretário Geral da FENPROF,  garante que batalha jurídica vai continuar depois do exame, na quarta-feira, contra regime de dispensa que não existe na lei.

Mário Nogueira garante ser impossível Arménio Carlos chamar a si a negociação de um diploma de Educação, como fez o líder da UGT, mas diz que já avisou o Secretário Geral da CGTP-IN de que "matérias de professores é a FENPROF que conduz”. O líder da FENPROF está no seu último mandato e admite voltar a dar aulas, mais de duas décadas depois. 

O que pretende com a greve ao serviço da prova dos docentes contratados? 
Temos consciência de que eliminar a prova depende de uma decisão política. O que pretendemos é que a prova não se realize ou pelo menos que não se realize no maior número de escolas. Se somos contra, temos de a contrariar. Não podemos sacrificar algum em nome de um benefício de outros e contribuir para a sua legitimação. 

Discorda da dispensa? 
Não são dispensas. As pessoas pediram para não fazer a prova e o MEC aceitou. É arbitrário. Qualquer professor com menos de cinco anos de serviço que conteste isso em tribunal, na minha opinião, ganha com facilidade. 

Sabe de professores que ponderem contestar? 
Há muitos que estão a pensar nisso e cujo processo estamos a acompanhar no plano jurídico. 

Vão interpor ações depois da prova? 
Exatamente. Uma pessoa nessa situação só tem de requerer ao ministério os fundamentos legais de quem foi dispensado, porque não há nada na lei. 

Há o risco de a prova se realizar e depois ser anulada?
Sim, há o risco, se o tribunal concluir que foi feita num quadro de ilegalidade. 

O líder da FNE, João Dias da Silva, disse que a prova vale para 400 professores. Faz a mesma estimativa?
Não e acho isso gravíssimo. Esses 400 são os que têm menos de cinco anos de serviço e estão a trabalhar. Não podemos ser nós a dizer que um professor desempregado já não é professor, senão seremos nós a deitar para o lixo aquilo que o ministério quer. E já seria um segundo favor que se fazia ao Governo. 

O acordo entre a UGT e o Governo enfraqueceu a contestação à prova? 
Para já, nem sei se há acordo. Nesses casos, normalmente há uma folha assinada, mas há uma ausência total de transparência. Estive numa iniciativa da CGTP e disse ao secretário-geral que nas matérias especificas dos professores quem negoceia é a Fenprof. 

Sentir-se-ia desautorizado? 
Nem é uma questão de desautorização, mas de falta de legitimidade da parte de quem fez isso. Mas tenho a certeza que o secretário-geral da CGTP jamais faria tal, porque respeita todos os professores e organizações sindicais, da CGTP ou não. 

A confirmar-se uma prova similar ao guião divulgado pelo MEC, se algum professor reprovar considera que deve deixar o ensino?
Não. Considero que quem concebeu a prova é que deve sair do sistema. Se a prova é tão fácil que nem se compreende que alguém não tenha sucesso, então para que é que ela serve? Tenho a certeza que não serve para se ser professor. 

O que faz um bom professor? 
Uma boa formação, inicial e contínua. 

Se a prova fosse de acesso à carreira, aceitá-la-ia? 
Não, porque não faz sentido. Um professor, quando acaba o seu curso, é profissionalizado. Faz cinco anos de formação, depois faz o período probatório. A prova é um requisito que não consta da Lei de Bases do Sistema Educativo e por isso é ilegal. 

Para si, a intenção do Governo é despedir? 
Penso que também pode ter outro objetivo. Claro que nos últimos sete anos saíram mais de 25 mil professores para a aposentação e entraram nos quadros 1002; desde 2010 passámos de 36 mil contratados para 12 mil. Mas o Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário, João Grancho, há muito que se bate como ninguém pela criação de uma Ordem. Não havia justificação para a sua existência, mas a confirmar-se a aplicação da prova, daqui a uns tempos ouviremos que não faz sentido ser o Estado a regular o acesso à profissão... 

A prova pode ser aplicada aos docentes do quadro? 
Não sei se há a possibilidade, mas consta de um relatório do FMI de janeiro, onde se lê que o sistema educativo português tem excesso de pessoal e que as medidas seguidas até agora não permitirão atingir os objetivos de consolidação orçamental, pelo que vão ser precisas mais saídas. 

Já sentiu saudades de Maria de Lurdes Rodrigues?
Não, porque abriu muitas das portas por onde entraram os atuais governantes. Mas distingo uma coisa: acredito que não tenham sido abertas com o objetivo de destruir a escola pública. Os anteriores governos não souberam ganhar os professores. O atual ministro, colocando-se na primeira linha da contestação, conseguiu que muitos, absolutamente fartos, tivessem ouvido as suas críticas mas não a sua alternativa. Hoje, ainda é fácil ouvir: Nuno Crato desiludiu-me. 

Foi mais fácil contestar a divisão da carreira do que o emagrecimento do sistema? 
Sim, era mais concreto. Hoje, as pessoas estão cheias de medo. Não do Nuno Crato, mas pela sua própria vida e futuro. 

O medo está a retrair a mobilização? 
Sim. As pessoas estão revoltadas, tristes mas cheias de medo. Há dias, em Coimbra, encontrei uma colega de 55 anos a enviar currículos para Moçambique, com medo da mobilidade especial. 

É um professor ou um líder político-sindical? 
Sou um professor, que vai à sua escola muitas vezes. E sou sindicalista, não político. 

Está no último mandato. A seguir, reforma-se ou pondera regressar a uma sala de aula, ao fim de 22 anos?
Não me posso reformar daqui a três anos. Por isso, posso voltar à minha escola e farei o que os outros fazem: darei aulas. 

 Alexandra Inácio, JN, 16/12/2013

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