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Sobre a recuperação do tempo de serviço congelado e a luta para o conseguir

Falar claro!

25 de abril, 2018

Os professores, tal como outros profissionais da Administração Pública, viram congelados mais de 9 anos e 4 meses, tempo que o governo tenta não recuperar na íntegra. Em 18 de novembro de 2017, pressionado pela luta dos professores, o governo comprometeu-se a recuperar todo o tempo; em 15 de dezembro, a Assembleia da República, sob proposta do PEV e contando com os votos de PS, BE e PCP, recomendou ao governo a contagem de todo o tempo de serviço para efeitos de carreira. Entretanto, em 29 de dezembro é publicada a Lei n.º 114/2017, contendo o Orçamento do Estado para 2018, que, no seu artigo 19.º, prevê a necessidade de ser negociado o prazo e o modo de recuperação. Quanto ao tempo a recuperar, não se prevê negociação, pois, como diversos deputados lembraram ao ministro, em 28 de março, o tempo a recuperar é todo o que esteve congelado, sendo esse o objeto do já referido artigo 19.º.

Na verdade, se o tempo de serviço a recuperar fosse questão em aberto, o OE, no seu artigo 19.º, teria previsto que a negociação a fazer incidiria no tempo, no prazo e no modo. Contudo, não se refere o tempo, pois esse é dado adquirido: 9 anos, 4 meses e 2 dias.

Não está, porém, convencido o PS, daí que, confrontado com o voto favorável à Resolução 1/2018, que recomenda a contagem de todo o tempo de serviço, o deputado responsável pela Educação no grupo parlamentar tem afirmado que se recomenda o desejável e legisla o possível. Esta posição foi reiterada em reunião realizada com a FENPROF em 18 de abril.

Neste quadro, se na Assembleia da República fosse agendada a discussão de um projeto de lei, por exemplo, da iniciativa de cidadãos, abrir-se-ia a porta ao agendamento de outras iniciativas legislativas, designadamente do governo, no sentido de passar para lei o que, até agora, não conseguiu impor aos sindicatos de professores: recuperar, apenas, 2 anos, 9 meses e 18 dias, apagando mais de 70% do tempo cumprido durante o congelamento. E, repare-se, não é por acaso que o governo não apresentou aquela proposta em projeto de diploma legal. É que sabe que só o poderá fazer se nós – professores e organizações sindicais – aceitarmos negociar o tempo de serviço. Não vamos abrir a porta para que, por outra via, o governo concretize tal objetivo. O tempo de serviço não se negoceia, conta-se, e a lei já o obriga!

Mas há mais dois problemas na iniciativa.

Um é exigir que a contagem integral e consequente reposicionamento tenham lugar em 2019. Só por si, inviabilizaria a aprovação da contagem de todo o tempo, pois dificilmente contaria com o apoio de qualquer grupo parlamentar, dado o peso que teria no Orçamento do Estado de um só ano. Que é justa a exigência, disso não há qualquer dúvida. O problema é que, com ela, poríamos em causa o essencial: a recuperação de todo o tempo que foi prestado. Diz-nos a experiência que a abertura para negociar um faseamento foi sempre a forma de garantir a recuperação de períodos de tempo perdidos. A proposta que a FENPROF apresentou vai no sentido de, praticamente todos os anos, os professores mudarem um escalão, garantindo que em 2023 tenham recuperado todo esse tempo.

O outro problema tem a ver com a avaliação do desempenho. Durante os períodos de congelamento, em que a avaliação esteve suspensa, houve escolas que quiseram, apesar disso, avaliar os professores. Muitos recusaram, já que a progressão estava congelada. Com a Lei do Orçamento do Estado para 2018, os professores foram todos avaliados de Bom no período de congelamento. Teria sentido que, agora, fosse aprovada uma lei que retirasse a menção de Bom a quem recusou ser avaliado naquele período, implicando a perda de tempo de serviço? Claro que não.

São estas e não outras as razões por que a FENPROF não apoia a iniciativa legislativa de cidadãos sobre a recuperação do tempo de serviço. A FENPROF não tem qualquer problema em aderir a iniciativas que partam dos professores, pelo contrário, mas não adere apenas por aderir. A FENPROF tem a responsabilidade de representar os professores, desde logo os seus mais de 50.000 associados, e depois, em abstrato, todos os que exercem a profissão docente. Como tal, não pode entrar em iniciativas que possam resultar em “tiro no pé”, como é o caso desta, que tem elevadíssimos riscos de o resultado final ser contrário ao seu objetivo.

Tivessem os autores da iniciativa procurado uma opinião, apenas isso, e a FENPROF teria colocado as suas preocupações. O que aconteceu foi que os colegas que decidiram avançar com a iniciativa limitaram-se, depois de a lançar publicamente, a apelar à “comunidade sindical” para que a apoiassem. Ora, a FENPROF – a maior organização e, por isso, com redobradas responsabilidades – não pode apoiar iniciativas que, não tendo essa intenção, se poderão virar contra os professores.

Como pressionar o governo e o PS, enquanto partido do governo, a resolver este problema?

Lutando! Não há forma de substituir a luta por outro tipo de iniciativa. Foi lutando que levámos o governo a assumir o compromisso; foi com a pressão da luta que o PS acabou por acompanhar os partidos que recomendaram ao governo a contagem de todo o tempo de serviço congelado; será com a luta que levaremos o governo a respeitar o que motivou a aprovação do artigo 19.º da Lei do Orçamento do Estado. O enquadramento político existe; a consagração está na Lei. É precisa a nossa luta para que se cumpra!

Todas as organizações sindicais de professores estão unidas nesta luta. Façamos tudo para que também todos os colegas se unam nessa justa exigência: contar o tempo para carreira para todos os que ainda podem usufruir dele; permitir a utilização desse tempo para antecipação da aposentação daqueles que, estando nos escalões de topo, já não poderão recuperar integralmente esse tempo na carreira.

E a próxima luta em que os professores estarão unidos será a Manifestação do próximo dia 19 de maio! Luta que, face ao desrespeito de que os professores e educadores estão a ser alvo, terá de ser muito grande. E vai ser! Trabalhemos todos para isso, pois da luta sairá reforçada a nossa capacidade negocial para recuperarmos o tempo de serviço, mas, igualmente, para conseguirmos um regime específico de aposentação, horários adequados e dentro da lei ou a eliminação da precariedade.

O Secretariado Nacional da FENPROF